terça-feira, 16 de agosto de 2022

Sono: mundo dorme cada vez menos e isso afeta até a economia (Parte 1)

O sono faz parte da vida. É uma necessidade fisiológica, assim como beber água, se alimentar, ir ao banheiro, respirar. Ele é fundamental para a nossa existência. E o impacto de noites mal dormidas, quando viram rotina e não se busca ajuda, gera distúrbios e desequilíbrios capazes de afetar todos os órgãos e sistemas do corpo humano.

Com a correria do dia a dia, o sono pode ser visto como algo trivial – e muitos encontram na privação do sono voluntária uma oportunidade de produzir mais ou ter uma vida social mais ativa sem medir as consequências. Na outra ponta, de forma não proposital, não é incomum que famílias tenham essa rotina do sono modificada pela maternidade, por exemplo.

No Brasil, 65% dos brasileiros afirmam ter baixa qualidade de sono e apenas 7% procuram ajuda médica para isso. E ainda que 34% dos entrevistados afirmem ter insônia, apenas 21% desses possuem o diagnóstico médico da doença. Os dados são de uma pesquisa realizada pelo Ibope, encomendada por uma farmacêutica, em 2020.

O problema não é exclusivo daqui: a Organização Mundial da Saúde (OMS) diz que 4 em cada 10 pessoas no mundo não têm sono de boa qualidade. De acordo com os especialistas, esse conceito varia de pessoa para pessoa e depende da faixa etária – e não se trata apenas da quantidade de horas dormidas, mas também da qualidade delas.

“O sono ideal é aquele que te restabelece, refaz e restaura para o dia seguinte. Por isso, despertar e ter um bem estar físico e mental é o que se espera, como referência, de um indivíduo que tem um bom sono”, afirma Andrea Bacelar, neurologista e diretora médica da Clínica Bacelar e membra da diretoria da Associação Brasileira do Sono (ABS).

Leonardo Ierardi Goulart, neurofisiologista especialista em medicina do sono e integrante do Departamento de Neurofisiologia Clínica do Hospital Israelita Albert Einstein., completa: “O que pode influenciar [uma boa noite de sono] é o estilo de vida, rotinas, aspecto social, atividade física, alimentação, aspecto emocional e doenças clínicas, mentais e do próprio sono”.
Impacto na saúde e economia

Diversos fatores chamaram a atenção do mercado nos últimos anos no que diz respeito à má qualidade do sono no mundo. Um levantamento da PS Market Research projetou para 2023 um faturamento de US$ 101 bilhões entre as empresas que trabalham com o objetivo de melhorar o sono. Em 2017, a receita foi de US$ 69,5 bilhões; em 2020, US$ 80 bilhões.

Entre as healthtechs que têm o sono – ou as doenças ligadas a ele – como foco, os aportes mais do que duplicaram nos últimos três anos: foram US$ 302 milhões em 2018, US$ 369 milhões em 2019 e US$ 611 milhões em 2020. Os dados são da plataforma Crunchbase.

No exterior, a conta às custas de noites mal dormidas já chegou – e é cara. Juntos, Estados Unidos, Reino Unido, Alemanha, Japão e Canadá já perdiam, em 2016, entre US$ 480 bilhões e US$ 680 bilhões por ano com o “mau sono” de seus trabalhadores.

A relação sono-economia pode causar estranhamento, mas é mais óbvia do que parece: pessoas cansadas são menos produtivas e podem ficar mais doentes, levando-as a faltarem ao trabalho com mais frequência do que quem tem um sono ideal.

Afinal, o dano também é físico: os que dormem menos de 6 horas por noite têm risco de mortalidade 13% maior do que os que dormem, em média, de 7 a 9 horas. Combinado ao tabagismo, consumo de álcool, altos níveis de stress e ausência de atividade física, a falta de uma boa noite de sono pode ativar uma bomba-relógio no corpo humano.

No Brasil, dados da ABS mostram que a população brasileira está dormindo menos: de 6,6 horas por dia em 2018, diminuiu para 6,4 horas por dia em 2019. Um estudo recente do Episono, do Instituto do Sono, mostra que, durante a pandemia, os brasileiros passaram a se deitar 64 minutos mais tarde. E 59,4% dos entrevistados acordam mais vezes durante a noite.
Não é apenas “contar carneirinhos”

Dormir pode parecer uma tarefa simples: deitar a cabeça no travesseiro e fechar os olhos. Mas o nosso corpo não para – muito menos o nosso cérebro. Tudo começa ainda na fase da vigília, que é quando estamos acordados. Ao pegar no sono, passamos para o Estágio I – responsável por 5% do ciclo do sono. O Estágio II é o famoso “sono leve”, em que ficamos 50% do tempo daquele ciclo. Já o Estágio III, do “sono profundo”, fica presente entre 20% e 25% do tempo.

Por fim, no sono REM, o corpo fica paralisado por meio da atonia muscular e o cérebro continua em funcionamento semelhante ao momento em que estamos acordados. O movimento ocular acelera e, por fim, a atividade onírica acontece.

As porcentagens dessas fases variam porque acaba-se tendo mais sono no Estágio III na primeira metade da noite e mais sono REM na segunda metade. Todo esse ciclo do sono se repete de 4 a 6 vezes em uma mesma noite – essa é a arquitetura esperada dos seres humanos que adotam o sono na fase escura das 24h.

“Quem dorme fora do horário habitual fisiológico de sono, ele nunca será restaurador – mesmo que o tempo total do sono seja o mesmo. Haverá hormônios que são produzidos na fase clara independente dele estar dormindo ou acordado”, explica a neurologista Andrea Bacelar.
Problemas no sono

Todos estão passíveis de serem acometidos por problemas ligados ao sono em algum momento da vida. E apesar de existirem alguns distúrbios mais conhecidos, como a insônia e a apneia, elas são apenas a ponta de um iceberg muito maior.

Ao todo são mais de 100, divididos em: respiração, como apnéia e ronca, ciclo circadiano, como jetlag e má-adaptação ao trabalho em turno, movimento, como síndrome das pernas inquietas e bruxismo, insônias, classificadas entre aguda e crônica, parassonias, como terror noturno e sonambulismo, ou hipersonias, que podem ser primárias, como narcolepsia, ou secundárias, causadas por fatores externos.

“O [problema do sono] mais prevalente e comum talvez seja a síndrome do sono insuficiente, que é quando a pessoa dorme menos do que o esperado para a faixa etária dela e isso causa sintomas diurnos”, explica o neurofisiologista Leonardo Ierardi Goulart, do Einstein. Ela é causa de grande parte das hipersonias hoje.

Ele explica que a síndrome é diferente da insônia, que é quando a pessoa tem sensação que dorme pouco devido ao excesso de alerta cerebral noturno, mas ela tem oportunidade para dormir. “Na síndrome do sono insuficiente, ela dorme menos do que precisa porque não tem oportunidade, tempo ou local adequado para isso”, completa.

De acordo com a neurologista Andrea Bacelar, assim como para o diagnóstico em outras especialidades, o médico se atém às queixas do paciente, faz perguntas em um processo conhecido como anamnese, e pode solicitar exames. Um deles é a polissonografia, exame que monitora as variações biofisiológicas que acontecem no corpo humano durante o sono. Ele pode tanto excluir quanto confirmar diagnósticos e auxiliar o médico a traçar as condutas de tratamento do paciente.

Na segunda parte desta reportagem especial, Futuro da Saúde trará soluções inovadoras para este problema e uma visão de futuro para o segmento.






Autor: Giulia Leal
Fonte: futurodasaude
Sítio Online da Publicação: futurodasaude
Data: 10/08/2022
Publicação Original: https://futurodasaude.com.br/sono-mundo-dorme-cada-vez-menos-e-isso-afeta-ate-a-economia-parte-1/

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