Uma série de estudos anteriores já demonstrou que o ecletismo alimentar dessa espécie é um dos fatores que levam à reinfestação do ambiente artificial, ou seja, que sofre alteração do homem. “Isso acontece porque, sendo capazes de utilizar diversos tipos de alimento, insetos provenientes do ambiente silvestre conseguem se adaptar às novas condições do ambiente artificial”, explica a pesquisadora Liléia Diotaiuti, líder do Grupo de Triatomíneos da Fiocruz Minas.
O estudo foi realizado no município cearense de Tauá, área endêmica para a doença de Chagas, com altos níveis de infestação por triatomíneos. Para chegar aos resultados, os pesquisadores visitaram 252 residências, distribuídas em 18 localidades rurais, com o intuito de capturar os triatomíneos. As buscas foram realizadas no intradomicílio (dentro de casa), peridomicílio (galinheiro, chiqueiro, celeiro, construções, etc), bem como em esconderijos entre rochas do ambiente silvestre. As visitas ocorreram entre fevereiro de 2009 e agosto de 2015.
Nas áreas residenciais, foram capturados ao todo 2.906 insetos, sendo 66,4% da espécie T. brasilienses e 33,4% Triatoma pseudomaculata. Já no ambiente silvestre, os 1077 espécimes coletadas foram identificados como T. brasilienses. Por meio de testes laboratoriais, verificou-se que estavam contaminados pelo T. cruzi 10,3% dos insetos encontrados dentro de casa; 3,1% no peridomílicio; e 3,3 % em ambiente silvestre. Os números apontam que, conforme já mencionado em estudos anteriores, o T. brasilienses é a principal espécie responsável pela manutenção do ciclo de transmissão do T. cruzi na região Nordeste do Brasil.
Do total de insetos coletados, 279 passaram por testes moleculares para identificação das fontes de alimento. Sangue de 21 espécies de vertebrados foi identificado no tubo digestivo dos triatomíneos, tendo características dos diferentes ambientes: silvestre, peridomiciliar e domiciliar. A maior parte das amostras encontradas se refere a roedores (57,8%), seguidos de caprinos (21/1%). Também foram detectados bovinos, gatos, galinhas, marsupiais, suínos e cavalos.
Dentre as amostras analisadas, não foi detectado DNA humano, fato incomum no histórico epidemiológico do T. brasiliensis. De acordo com os pesquisadores, isso pode ser reflexo do trabalho de controle realizado, minimizando o contato dos insetos com os humanos.
Os resultados do estudo demonstram a intensa mobilidade de T. brasiliensisna região estudada, fato reforçado pela marcação genética do T.cruzi. Linhagens desse parasita tipicamente de regiões silvestres foram detectadas nas amostras de insetos capturados dentro de casa. “Encontrar triatomíneos contaminados dentro e fora das casas aponta para o risco com que os moradores convivem e reforçam a necessidade de manutenção das ações de vigilância entomológica”, avalia Liléia.
Outro aspecto a ser destacado é a diversidade de fonte alimentares observadas no peridomicílio. Por se tratar de uma região inserida no bioma da caatinga, caracterizado por grande aridez, o entorno das residências acumula muitos esconderijos, como telhas, tijolos e se sobrepõe às rochas do ambiente natural, constituindo, assim, abrigo para animais domésticos e silvestres, bem como favorecendo a proliferação de colônias de triatomíneos.
“Por se tratar de uma região muito quente, os triatomíneos procuram locais onde possam se abrigar e fugir da luz do sol. Então, esses esconderijos produzidos pelo próprio homem são ambientes propícios para a proliferação do inseto. Além disso, o ambiente silvestre, constituído pelas rochas altamente infestadas e muito próximas das casas, contribui para a formação de colônias junto ao homem”, afirma a pesquisadora.
Intitulado Triatoma brasiliensis Neiva, 1911: food sources and diversity of Trypanosoma cruzi in wild and artificial environments of the semiarid region of Ceará, northeastern Brazil [Triatoma brasiliensis Neiva, 1911: fontes alimentares e diversidade de Trypanosoma cruzi em ambientes silvestres e artificiais da região semiárida do Ceará, nordeste do Brasil], o estudo foi publicado recentemente na revista Parasites&Vectors. A pesquisa que, além da Fiocruz Minas, envolveu a Universidade Federal do Ceará (UFC), a Secretaria de Estado de Saúde do Ceará e a Universidade de Buenos Aires é fruto da tese de doutorado de Cláudia Mendonça Bezerra, do Programa de Pós-Graduação em Saúde Pública da UFC, sob orientação da pesquisadora Liléia Diotaiuti (IRR) e do pesquisador Alberto Novaes Ramos Júnior, da UFC.
Autor: Keila Maia
Fonte: IRR/Fiocruz Minas
Sítio Online da Publicação: Fiocruz Minas
Data: 25/01/2019
Publicação Original: https://portal.fiocruz.br/noticia/doenca-de-chagas-estudo-analisa-fontes-de-alimentos-do-barbeiro
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