O hipertireoidismo é uma enfermidade que afeta múltiplos órgãos e sistemas, como sistema nervoso, cardiovascular e gastrointestinal, podendo também afetar o fígado.
Alterações na bioquímica hepática podem ocorrer em 15 – 79% de pacientes com tireotoxicose sem tratamento adequada. Na maioria dos casos, são alterações discretas, contudo 1-2% podem cursar com hepatite fulminante.
Uma revisão sistemática publicada em 2021 evidenciou que 55-60% dos pacientes com hipertireoidismo não tratado apresentavam pelo menos um parâmetro laboratorial hepático alterado (AST, ALT, FA, GGT, BT).
Exame % alterado
AST 23%
ALT 33%
FA 44%
GGT 24%
BT 12%
Como é a relação entre tireoide e fígado?
Em torno de 80% do T3 é proveniente de deiodinação de T4 no tecido extratireoidiano, em especial no fígado e o rim.
Em torno de 99% dos hormônios tireoidianos séricos estão ligados a proteínas produzidas principalmente no fígado, que ajudam a manter os hormônios tireoidianos livres do soro dentro da faixa de normalidade, promovendo a homeostase.
Os hormônios tireoidianos auxiliam nos processos metabólicos do fígado, como por exemplo no metabolismo da bilirrubina, através de ação na enzima glucuroniltransferase.
Quais são os mecanismos de alteração hepática no hipertireoidismo?
Toxicidade hepática direta por excesso de hormônios tireoidianos, devido a aumento de radicais livres pelo estado hipercatabólico;
Doença hepática autoimune associada – principalmente na doença de Graves;
Hepatopatia congestiva – insuficiência cardíaca de alto débito;
Doença hepática preexistente descompensada;
Lesão hepática induzida por droga antitireoidiana;
Degeneração de hepatócitos devido a proteólise e glicogenólise aceleradas.
Em situações de dano hepático por estado hipercatabólico, o principal mecanismo é por lesão isquêmica, devido ao aumento da demanda de O2 pelo fígado. No geral, cursam com lesão de padrão colestático, podendo haver elevação de BT. A fosfatase alcalina aumenta tanto devido a suas frações hepáticas, quanto pela atividade osteoblástica acelerada.
Em situações de insuficiência cardíaca congestiva decorrente da tireotoxicose, os pacientes cursam com aumentos de transaminases e enzimas canaliculares, podendo cursar com icterícia, ascite e hepatomegalia.
Até 10% dos pacientes com doença de Graves podem cursar com outras doenças autoimunes, como colangite biliar primária e hepatite autoimune. Esses pacientes no geral apresentam FAN positivo. Contudo podem ocorrer de CBP antimitocôndria negativo.
Aumento de enzimas hepáticas após o início do tratamento com as tionamidas podem ocorrer em 0,1% e 0,2% dos casos. Os principais fatores de risco são idade avançada e uso de altas doses da medicação. Se alterações graves, é indicado suspender a medicação e usar colestiramina, tratando o hipertireoidismo com iodoterapia ou cirurgia.
No geral, o tratamento adequado do hipertireoidismo permite a normalização dos marcadores hepáticos em mais de 50-87% dos casos.
Marcadores hepáticos % de normalização após tratamento do hipertireoidismo
AST 87%
ALT 83%
FA 53%
GGT 70%
BT 50%
Mensagens práticas
O hipertireoidismo é uma enfermidade comum em nosso meio, podendo cursar com alterações em enzimas hepáticas de maneira direta ou indireta. Dessa forma, é importante que ao identificarmos hipertireoidismo, solicitemos transaminases, enzimas canaliculares e bilirrubinas. Assim como o rastreio de função tireoideana deve estar incluso na avaliação etiológica de alterações no hepatograma.
Existem três principais cenários de alteração hepática no hipertireoidismo:
Em vigência de tireotoxicose sem insuficiência cardíaca.
Em vigência de tireotoxicose com insuficiência cardíaca – sendo esses casos os mais graves;.
Em vigência de drogas antitireoidianas (DILI) – especialmente em idosos ou pacientes com altas doses da medicação.
Deve-se atentar que na doença de Graves, a elevação dos marcadores hepáticas pode estar relacionada com outras doenças autoimunes associadas.
Autor: Fernanda Costa Azevedo
Fonte: pebmed
Sítio Online da Publicação: pebmed
Data: 16/05/2022
Publicação Original: https://pebmed.com.br/o-que-todo-clinico-precisa-saber-sobre-alteracoes-hepaticas-e-hipertireoidismo/
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