segunda-feira, 25 de outubro de 2021

Metformina versus insulina ou gliburida no controle do diabetes mellitus gestacional e desfechos neonatais

O diabetes mellitus gestacional (DMG) é uma condição de extrema importância para os desfechos neonatais. Com prevalência estimada em cerca de 18% no Brasil, atualmente é recomendado que todas gestantes tenham a glicemia de jejum (GJ) dosada no primeiro trimestre como parte do pré-natal. O diagnóstico do DMG, seguindo os critérios da IADPSG, validados e aceitos pela American Diabetes Association (ADA) e pela Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD), requerem alteração em apenas um parâmetro no teste oral de tolerância à glicose 75 g (TOTG, ou GTT) entre a 24ª e 28ª semana de gestação (Jejum ≥ 92 mg/dL, 1ª hora ≥ 180 mg/dL e 2ª hora ≥ 153 mg/dL). Considerando tais valores, extrapola-se a glicemia de jejum para o primeiro trimestre, considerando DMG caso a GJ ≥ 92 mg/dL, uma vez que a tendência nessas pacientes é de haver um incremento glicêmico sobretudo na segunda metade da gestação, onde há um aumento dos hormônios contrarreguladores.

Desde o HAPO trial, publicado no New England Journal of Medicine (NEJM) em 2008, é bem estabelecido que quanto maior a média glicêmica, piores são os desfechos neonatais, sobretudo quanto ao risco de feto GIG (maior que P90), hipoglicemia neonatal e maior risco de cesárea. É bem estabelecido que a hiperglicemia materna não controlada também se associa a maior risco de hiperbilirrubinemia neonatal, prematuridade, insuficiência respiratória e morte perinatal.


Já com relação ao tratamento, a principal medida eficaz na grande maioria das pacientes é a mudança do estilo de vida, com dietas equilibradas. Porém devido ao fato de vários antidiabéticos orais atravessarem a placenta e não apresentarem um perfil de segurança bem estabelecido, o tratamento padrão medicamentoso acaba sendo a insulinoterapia.

É sabido que a metformina atravessa a barreira hematoplacentária, mas os riscos associados ao uso durante a gestação e sobretudo a longo prazo são discutíveis. Considerando esses fatores, recentemente foi publicada uma metanálise de ensaios clínicos randomizados que buscou avaliar a eficiência e segurança no uso de insulina, metformina e gliburida (uma sulfonilureia) no diabetes mellitus gestacional, seus desfechos glicêmicos e perinatais.



A metanálise

Foram incluídos 4.533 participantes de 23 trials. A análise quantitativa final considerou apenas estudos analisados na forma “intention to treat”. Foram excluídos trials que não estavam bem pareados quanto à glicemia inicial. Os desfechos analisados incluíram o controle do DMG (baseado na glicemia de jejum, 2 horas pós-prandial e HbA1c) e desfechos neonatais, destacando o risco de hipoglicemia neonatal, hiperbilirrubinemia, macrossomia, morte perinatal, feto GIG e prematuridade. Os resultados foram comparados como diferença média padronizada (SMD, ou “tamanho de efeito”).
Resultados

a) Comparada a gliburida:
A metformina reduziu a glicemia pós-prandial (2 horas após): – 0,18 (SMD 0,01 – 0,34, IC 95%). Não houve diferenças quanto aos desfechos perinatais.

b) Comparada a insulina:
A metformina reduziu risco de hipoglicemia neonatal (diferença de risco – 0,07 (-0,11 a – 0,02, IC 95%), porém houve grande heterogeneidade nos trabalhos que avaliaram tal desfecho (I² 56%);
O grupo metformina teve menor peso ao nascer: -0,17 (SMD -0,25 a – 0,08; IC 95%). Houve uma tendência a menor incidência de macrossomia, mas sem significância estatística;
Menor ganho de peso materno: – 0,61 (SMD – 0,86 a – 0,35, IC 95%).

A metformina foi tão efetiva quanto a insulina no controle glicêmico, com bom potencial para controle da glicemia pós-prandial e com baixa prevalência de hipoglicemia neonatal, macrossomia e internações em UTI, além de levar a menor ganho de peso materno e fetal.


Ainda, não foram encontradas diferenças em hiperbilirrubinemia neonatal, trauma obstétrico, morte perinatal, prematuridade, grandes ou pequenos para idade gestacional, o que sugere que a metformina parece ser segura a curto prazo.
Na prática

Esta metanálise traz informações favoráveis à metformina quanto aos desfechos fetais. Claro, devemos lembrar da metformina como uma medicação possível no tratamento do DMG. No entanto, o estudo analisou de forma exclusiva os efeitos gestacionais a curto prazo e há discussão sobre o papel da metformina ao longo da vida, se ela poderia aumentar por exemplo o risco de obesidade infantil. A ADA e a FEBRASGO ainda recomendam a insulina como tratamento inicial para o diabetes mellitus gestacional, sendo que a ANVISA libera para uso na gestação apenas caso a gestante assine um termo de consentimento livre e esclarecido (vale lembrar que a droga é categoria B na gestação).

Desta forma, considerando a segurança no tratamento com insulina, a metformina pode ser considerada como uma segunda opção naquelas pacientes com extrema resistência insulínica, com necessidade de doses muito elevadas para melhor controle do diabetes.







Autor: Luiz Fernando Fonseca Vieira
Fonte: pebmed
Sítio Online da Publicação: pebmed
Data: 25/10/2021
Publicação Original: https://pebmed.com.br/metformina-versus-insulina-ou-gliburida-no-controle-do-diabetes-gestacional-e-desfechos-neonatais/

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