quarta-feira, 18 de agosto de 2021

Vacinação contra Covid-19 e terceira dose

Com a emergência da variante Delta e o aumento no número de casos no Brasil e em outros países, surgiu a preocupação em relação à eficácia das vacinas existentes. Ao mesmo tempo, a durabilidade da proteção conferida pela vacina e se a resposta vacinal é a mesma em todas as populações são questões ainda não totalmente elucidadas.

Diante de todas essas dúvidas, a possibilidade de uma dose adicional aos esquemas posológicos usuais ganha força internacionalmente. O CEO da Pfizer, Albert Bourla, anunciou que, diante dos dados coletados pela indústria, uma dose adicional do imunizante provavelmente seria necessária de 6 a 12 meses após imunização com 2 doses e que doses de reforço provavelmente serão necessárias anualmente. Esses comentários vão ao encontro ao que afirmou o CEO da Johnson & Johnson (grupo a qual pertence a Janssen), Alex Gorsky, que também acredita que a vacinação contra Covid-19 deverá ser anual.

Nesta quarta-feira, 18, o ministro da saúde, Marcelo Queiroga, anunciou que a terceira dose no país deve começar pelos idosos e profissionais de saúde, mas ainda não há previsão de início nem informações suficientes para embasar a decisão.

Estudos robustos sobre a necessidade e efetividade de uma terceira dose ainda não existem, mas começam a ser preparados. No Brasil, a Anvisa já autorizou a realização de quatro estudos que irão avaliar uma dose complementar aos esquemas vigentes. Paralelamente, a FDA aprovou o uso de terceira dose em pessoas imunossuprimidas.


Estudos em transplantados

Uma questão que se discute é se pessoas expostas a imunossupressores desenvolveriam a mesma resposta vacinal, com proteção duradoura, do que indivíduos não imunossuprimidos. Embora não haja estudos grandes sobre esse tópico, algumas evidências apontam para uma duração relativamente curta em títulos de anticorpos e em possível benefício com aplicação de uma dose adicional:

Uma série de casos norte-americana publicada na Annals of Internal Medicine descreve a resposta imunológica em pacientes transplantados, sem história prévia de Covid-19, que receberam 3 doses de imunizantes contra a doença, com um intervalo de 36 a 101 dias entre a segunda e terceira doses; dos 30 pacientes recrutados, 24 não apresentavam títulos mensuráveis e 6 apresentavam baixos títulos de anticorpos antes da terceira dose; cerca de 14 dias após este, todos os 6 pacientes com títulos baixos apresentaram altos títulos; já dos 24 pacientes considerados negativos, 25% apresentaram altos títulos, 8% apresentaram baixos títulos e 67% permaneceram negativos.

Os resultados de uma coorte francesa de receptores de transplante renal que não soroconverteram ao esquema primário de 2 doses e que receberam uma dose adicional da Moderna foram publicados na JAMA; 1 mês após a vacinação com a segunda dose, 159 pacientes tinham níveis de anticorpos < 50 AU/mL, sendo 59,7% considerados como não tendo resposta e 40,3% como com valores abaixo do nível de positividade; terceira dose foi administrada em uma mediana de 51 dias após a segunda, com 49% dos pacientes passando a apresentar valores acima do limite de positividade em uma mediana de 28 dias após; novamente, os pacientes que tiveram uma resposta fraca às duas doses apresentaram maior probabilidade de soroconversão do que os que não apresentaram resposta; pacientes tratados com tracolimus, micofenolato e corticoides estiveram menos propensos a desenvolver anticorpos do que indivíduos tratados com outros imunossupressores.

Um ensaio clínico duplo-cego e randomizado em receptores de transplante de órgãos sólidos para avaliar uma terceira dose de Moderna foi publicado na NEJM; 120 pacientes foram incluídos para receber uma dose adicional de vacina ou placebo; os regimes de imunossupressão foram equilibrados entre os grupos; após 1 mês, 55% dos pacientes que receberam a vacina apresentaram títulos de anticorpos > 100 U/mL em contraste com 18% dos pacientes no grupo placebo; 60% vs. 25% dos participantes apresentaram níveis de anticorpos neutralizantes acima do cut-off de 30% no grupo que recebeu terceira dose e que recebeu placebo, respectivamente.

Estudos de população geral

Estudos em relação à duração da imunidade e ao efeito de uma terceira dose na população geral também são raros. Dentre as vacinas disponíveis no Brasil, existem algumas poucas evidências sobre a Coronavac, publicadas ainda como pré-print.

Trata-se de dois estudos clínicos de fase 1/2 conduzidos na China, um avaliando indivíduos de 18 a 59 anos e outro avaliando idosos com 60 anos ou mais. No primeiro estudo, os autores notaram que os títulos de anticorpos caíram para abaixo do cut-off de soropositividade quando dosados 6 a 8 meses após a segunda dose. Quando vacinados com uma terceira dose cerca de 6 a 8 meses após a segunda, os níveis de anticorpos subiram para valores aproximadamente 3 a 5 vezes maiores do que os encontrados 28 dias após a segunda dose.

O segundo estudo, com indivíduos com 60 anos ou mais, apresentou resultados semelhantes. Praticamente todos os participantes apresentavam títulos de anticorpos neutralizantes abaixo do nível de soropositividade 6 meses após a aplicação da segunda dose. Uma terceira dose administrada 8 meses depois do esquema habitual levou ao aumento nos títulos de anticorpos de forma significativa, com média de soropositividade de 100% após 28 dias.

Autor(a):

Isabel Cristina Melo Mendes


Infectologista pelo Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (UFRJ) ⦁ Graduação em Medicina na Universidade Federal do Rio de Janeiro


Referências bibliográficas
CNBC. Pfizer CEO says third Covid vaccine dose likely needed within 12 months. Disponível em: https://www.cnbc.com/2021/04/15/pfizer-ceo-says-third-covid-vaccine-dose-likely-needed-within-12-months.html
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Autor: Isabel Cristina Melo Mendes
Fonte: pebmed
Sítio Online da Publicação: pebmed
Data: 18/08/2021
Publicação Original: https://pebmed.com.br/eficacia-da-cnaf-na-pre-oxigenacao-durante-a-sequencia-rapida-de-intubacao/

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