Nas últimas décadas foram feitos grandes avanços na compreensão dos DC, dando esperança de recuperação significativa para alguns pacientes. Essa nova compreensão veio por meio da elucidação dos mecanismos subjacentes a esses transtornos, se traduzindo em melhor acurácia prognóstica e novas possibilidades de tratamento.
Coma, estado vegetativo, ou estado de mínima consciência?
Basicamente, os distúrbios que envolvem redução da consciência podem ser divididos em três grupos: coma, estado vegetativo (atualmente: unresponsive wakefulness syndrome), e estado de mínima consciência. O coma se caracteriza pela ausência completa do despertar, mesmo após estímulo nocivo vigoroso. No estado vegetativo ocorre o despertar, com abertura ocular, porém sem qualquer reação ou interação com estímulos externos ou internos (volitivos). No estado de mínima consciência (EMC) ocorre despertar com reatividade a estímulos externos O EMC é extremamente heterogêneo, variando desde pacientes com respostas consistentes ao meio externo, interação discreta/inconsistente, até a presença de reatividade detectada apenas através de exames complementares. Além disso, o EMC pode ser dividido conforme a presença de linguagem (EMC+), ou sua ausência (EMC-). O paciente com EMC+ obedece aos comandos, possui verbalização inteligível e volição.
Patogênese do distúrbio de consciência
Um mecanismo fisiopatológico comum, subjacente aos distúrbios de consciência, é a perda das sinapses excitatórias no cérebro. A perda do tônus excitatório cortical leva a um estado de hiperpolarização com predomínio da ação de canais de potássio voltagem-dependentes. Esse processo é conhecido como “desfacilitação“. Em pacientes com desfacilitação disseminada, é possível observar um ritmo muito lento de disparo neuronal (inferior a 1 Hertz), ao longo do sistema corticotalâmico.
Recuperação da atividade cerebral
A recuperação do coma envolve vários mecanismos, culminando na restauração da neurotransmissão excitatória através das conexões córtico-cortical, tálamo-cortical e tálamo-estriada de longo alcance, associada a desativação dos circuitos envolvidos na desfacilitação.
Para lesões cerebrais estruturais, propõe-se um mecanismo de recuperação chamado “modelo de mesocircuito” que se concentra no papel dos neurônios talâmicos centrais e suas conexões frontoestriatais. Resumidamente, nesse modelo a perda de células inibitórias do corpo estriado leva a uma ativação do globo pálido, que por sua vez produz ação inibitória sobre o tálamo. O tálamo inibido, deixa de realizar sua ação excitatória sobre o córtex.
A recuperação do nível de consciência depende, em última análise, da recuperação do sistema reticular ativador ascendente. Sua atividade deve produzir estímulo suficiente para o prosencéfalo e rede frontoparietal para despolarizar os neurônios neocorticais, facilitando seu disparo.
Tratamento
A maioria dos trabalhos em pacientes com distúrbios da consciência, subaguda a crônica, testou estimulantes dopaminérgicos, por exemplo, amantadina, metilfenidato, levodopa, bromocriptina e apomorfina subcutânea.
No entanto, destas terapias, a única demonstrou benefício em ensaio randomizado controlado (RCT) com placebo foi a amantadina. A medicação foi associada à recuperação funcional acelerada em pacientes em estado vegetativo ou estado de mínima consciência, após TCE, no período entre 4 a 16 semanas após a lesão. A dose inicial utilizada foi de 100 mg/dia, com progressão para 200 mg/dia, mantida por 4 semanas, seguido de desmame progressivo ao longo de 2 semanas. Esta intervenção, na ausência de outra causa que explique o distúrbio, é recomendada desde 2018 pela AAN (American Association of Neurology), e pelo ACRM (Congresso Americano de Medicina de Reabilitação).
Outras terapias emergentes, como estimulação cerebral profunda (DBS) ou transcraniana (elétrica por corrente contínua ou magnética) também estão sendo estudadas para estes pacientes.
Mensagem Final
Os diferentes distúrbios do nível de consciência, como estado vegetativo, e estado de mínima consciência envolvem um grupo extremamente heterogêneo de pacientes, com prognósticos distintos. À medida que nosso conhecimento sobre a fisiopatologia desses estados evolui, conseguimos distinguir melhor quais pacientes são melhores candidatos a RCT sobre possíveis terapias. Esperamos no futuro trabalhos envolvendo terapias emergentes nessa população, especialmente aqueles com estado de mínima consciência, que engloba pacientes com prognóstico neurológico mais favorável.
Autor: Chadi Emil Adamo
Fonte: pebmed
Sítio Online da Publicação: pebmed
Data: 10/11/2021
Publicação Original: https://pebmed.com.br/recuperacao-dos-disturbios-de-consciencia-mecanismos-prognostico-e-terapias-emergentes/
Basicamente, os distúrbios que envolvem redução da consciência podem ser divididos em três grupos: coma, estado vegetativo (atualmente: unresponsive wakefulness syndrome), e estado de mínima consciência. O coma se caracteriza pela ausência completa do despertar, mesmo após estímulo nocivo vigoroso. No estado vegetativo ocorre o despertar, com abertura ocular, porém sem qualquer reação ou interação com estímulos externos ou internos (volitivos). No estado de mínima consciência (EMC) ocorre despertar com reatividade a estímulos externos O EMC é extremamente heterogêneo, variando desde pacientes com respostas consistentes ao meio externo, interação discreta/inconsistente, até a presença de reatividade detectada apenas através de exames complementares. Além disso, o EMC pode ser dividido conforme a presença de linguagem (EMC+), ou sua ausência (EMC-). O paciente com EMC+ obedece aos comandos, possui verbalização inteligível e volição.
Patogênese do distúrbio de consciência
Um mecanismo fisiopatológico comum, subjacente aos distúrbios de consciência, é a perda das sinapses excitatórias no cérebro. A perda do tônus excitatório cortical leva a um estado de hiperpolarização com predomínio da ação de canais de potássio voltagem-dependentes. Esse processo é conhecido como “desfacilitação“. Em pacientes com desfacilitação disseminada, é possível observar um ritmo muito lento de disparo neuronal (inferior a 1 Hertz), ao longo do sistema corticotalâmico.
Recuperação da atividade cerebral
A recuperação do coma envolve vários mecanismos, culminando na restauração da neurotransmissão excitatória através das conexões córtico-cortical, tálamo-cortical e tálamo-estriada de longo alcance, associada a desativação dos circuitos envolvidos na desfacilitação.
Para lesões cerebrais estruturais, propõe-se um mecanismo de recuperação chamado “modelo de mesocircuito” que se concentra no papel dos neurônios talâmicos centrais e suas conexões frontoestriatais. Resumidamente, nesse modelo a perda de células inibitórias do corpo estriado leva a uma ativação do globo pálido, que por sua vez produz ação inibitória sobre o tálamo. O tálamo inibido, deixa de realizar sua ação excitatória sobre o córtex.
A recuperação do nível de consciência depende, em última análise, da recuperação do sistema reticular ativador ascendente. Sua atividade deve produzir estímulo suficiente para o prosencéfalo e rede frontoparietal para despolarizar os neurônios neocorticais, facilitando seu disparo.
Tratamento
A maioria dos trabalhos em pacientes com distúrbios da consciência, subaguda a crônica, testou estimulantes dopaminérgicos, por exemplo, amantadina, metilfenidato, levodopa, bromocriptina e apomorfina subcutânea.
No entanto, destas terapias, a única demonstrou benefício em ensaio randomizado controlado (RCT) com placebo foi a amantadina. A medicação foi associada à recuperação funcional acelerada em pacientes em estado vegetativo ou estado de mínima consciência, após TCE, no período entre 4 a 16 semanas após a lesão. A dose inicial utilizada foi de 100 mg/dia, com progressão para 200 mg/dia, mantida por 4 semanas, seguido de desmame progressivo ao longo de 2 semanas. Esta intervenção, na ausência de outra causa que explique o distúrbio, é recomendada desde 2018 pela AAN (American Association of Neurology), e pelo ACRM (Congresso Americano de Medicina de Reabilitação).
Outras terapias emergentes, como estimulação cerebral profunda (DBS) ou transcraniana (elétrica por corrente contínua ou magnética) também estão sendo estudadas para estes pacientes.
Mensagem Final
Os diferentes distúrbios do nível de consciência, como estado vegetativo, e estado de mínima consciência envolvem um grupo extremamente heterogêneo de pacientes, com prognósticos distintos. À medida que nosso conhecimento sobre a fisiopatologia desses estados evolui, conseguimos distinguir melhor quais pacientes são melhores candidatos a RCT sobre possíveis terapias. Esperamos no futuro trabalhos envolvendo terapias emergentes nessa população, especialmente aqueles com estado de mínima consciência, que engloba pacientes com prognóstico neurológico mais favorável.
Autor: Chadi Emil Adamo
Fonte: pebmed
Sítio Online da Publicação: pebmed
Data: 10/11/2021
Publicação Original: https://pebmed.com.br/recuperacao-dos-disturbios-de-consciencia-mecanismos-prognostico-e-terapias-emergentes/
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