Apesar de altamente prevalente, a detecção de tuberculose (TB) em pacientes HIV que precisam de internação hospitalar pode ser desafiadora. Fatores como imunossupressão grave, sintomas atípicos e/ou inespecíficos, formas extrapulmonares e disseminadas e apresentações paucibacilares são frequentes nessa população e dificultam a suspeita clínica e o diagnóstico da doença.
Desde 2011, a Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda que pacientes com HIV – incluindo os que são internados – sejam rastreados para tuberculose por meio da pesquisa de 4 sinais e sintomas principais: tosse atual, febre, perda ponderal e sudorese noturna. Caso esse rastreio seja positivo, pacientes internados devem ser submetidos a um teste rápido molecular diagnóstico, como Xpert MTB/RIF ou Xpert MTB/RIF Ultra, ambos disponíveis no Brasil.
Materiais e métodos
Para a revisão sistemática, foram incluídos estudos transversais, observacionais e ensaios randomizados que coletaram pelo menos uma amostra de escarro para cultura de micobactéria ou Xpert em indivíduos com 10 anos ou mais com infecção pelo HIV e que estavam internados, independente da presença de sinais ou sintomas sugestivos de TB. Estudos de caso-controle, que só incluíram pacientes com suspeita de TB ou que recrutaram participantes com diagnóstico ou em tratamento para TB ativa.
Foram considerados como exames de rastreio: a pesquisa de sinais e sintomas, valores de proteína C reativa, radiografia de tórax ou pesquisa de presença de tosse por mais de 2 semanas, anemia, IMC < 18,5 kg/m² ou linfonodomegalia.
Os dados individuais primeiramente foram analisados separadamente em cada estudo e depois agregados. Em um primeiro passo, o grupo do estudo estimou a prevalência de tuberculose, a proporção de pacientes que seriam elegíveis de acordo com a estratégia da OMS e a performance dos métodos diagnósticos individualmente para cada estudo. Em um segundo passo, os dados de prevalência de tuberculose e de proporção de pacientes internados elegíveis para testagem com Xpert foram agregados.
Resultados
Das 6.162 publicações encontradas, 6 foram consideradas elegíveis, correspondendo a dados de 3.660 indivíduos. Cinco estudos foram conduzidos na África Subsaariana e 1 na Ásia. Todos os estudos sistematicamente coletaram amostras de escarro para Xpert, 4 coletaram escarro para cultura e 2, urina para Xpert.
A mediana de idade foi de 37 anos, 58% dos participantes eram mulheres e 67% estavam em uso de terapia antirretroviral (TARV). A mediana de contagem de linfócitos T-CD4 foi 205 células/mm³.
Entre os estudos que coletaram amostras de escarro para cultura, a prevalência agregada de tuberculose foi de 20% (IC 95% = 13 – 28%) quando a cultura era o padrão de referência e de 25% (IC 95% = 18 – 33%) quando o padrão foi o Xpert. Entre os 6 estudos, a proporção de indivíduos com pelo menos um dos 4 sinais e sintomas de rastreio recomendado pela OMS foi de 90% (IC 95% = 89 – 91%), variando entre os estudos de 85 a 100%.
Em relação à performance dos testes ou estratégias de rastreio, quando avaliados testes individuais, a pesquisa de sinais e sintomas e valores de PCR apresentaram-se os mais sensíveis, mas com baixa especificidade. Tosse por pelo menos 2 semanas, anemia com Hb < 8 g/dL, IMC < 18,5 kg/m² e linfonodomegalia tiveram especificidades de moderada a alta, mas com baixa sensibilidade, sendo considerados inadequados como testes de rastreio. Os dados em relação à radiografia de tórax foram escassos. Nas estratégias que combinaram a pesquisa de sinais e sintomas com PCR, as sensibilidades foram altas, mas as especificidades foram baixas.
A sensibilidade do algoritmo atual da OMS de pesquisa de sinais e sintomas seguida de realização de Xpert foi de 76% (IC 95% = 67 – 84%) e a especificidade foi de 93% (IC 95% = 88 – 96%). A acurácia diagnóstica da utilização universal de Xpert na população de indivíduos HIV-positivos internados foi semelhante, com uma sensibilidade de 78% (IC 95% = 69 – 85%) e uma especificidade de 93% (IC 95% = 87 – 96%).
Baseado nesses resultados, a OMS recomenda a utilização de estratégia universal de testagem com teste rápido molecular em todos os pacientes com HIV que são internados em regiões de alta prevalência de TB (> 10%). Uma vez que as performances entre as estratégias de rastreio e a aplicação universal do teste rápido molecular foram semelhantes, a utilização de teste universal poderia reduzir a complexidade do algoritmo diagnóstico. Além disso, os autores também encontraram uma positividade de 2% no Xpert nessa população em indivíduos que não seriam elegíveis para o teste se a estratégia de rastreio por sinais e sintomas fosse implementada. Como a concordância entre as estratégias é alta, o grupo acredita que a adoção de testagem universal não resultaria em grandes diferenças de custo.
Mensagens práticas
Os resultados desse estudo sugerem benefício na utilização de teste rápido molecular em todos os indivíduos HIV positivos que necessitam de internação hospitalar, independente da presença de sinais ou sintomas de TB à admissão, como forma de diagnóstico e, por consequência, de tratamento precoces.
Os resultados acima levaram à recomendação da OMS em 2021 de que, em locais em que a prevalência de TB seja > 10%, todos os indivíduos adultos e adolescentes com HIV submetidos à internação hospitalar devem ser rotineiramente testados com um teste rápido molecular. Essa estratégia é fortemente recomendada e considerada como tendo nível de evidência moderado para a acurácia do teste.
Autor: Isabel Cristina Melo Mendes
Fonte: PEBMED
Sítio Online da Publicação: PEBMED
Data: 05/04/2022
Publicação Original: https://pebmed.com.br/rastreio-de-tb-em-pacientes-hiv-internados-deve-se-realizar-teste-molecular-universal/
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