segunda-feira, 14 de dezembro de 2020

Pesquisador da UFF desenvolve modelo que ajuda a desvendar a evolução dos solos




"A figura representa o modelo desenvolvido por Fábio Reis: mostra desde a escala molecular até a superfície da Terra (solo). O modelo foi aplicado à terceira imagem da ilustração (clast), indicando a parte oxidada em amarelo e a parte que ainda não reagiu em verde" (Imagem: Science)


A elaboração e solução de um modelo matemático era o que faltava para ajudar a desvendar aspectos da evolução dos solos em um trabalho de pesquisa, cuja parte experimental estava pronta desde 2018. A participação do professor do Instituto de Física da Universidade Federal Fluminense (UFF), Fábio Reis, especialista em Física Estatística, complementou o trabalho desenvolvido pelo grupo da pesquisadora Susan Brantley, na Pennsylvania State University (EUA). O resultado da cooperação foi publicado este mês na revista Science (https://science.sciencemag.org/content/370/6515/eabb8092.

O modelo proposto pelo pesquisador descreve a oxidação da pirita, mineral popularmente conhecido como ‘ouro de tolo’, da escala molecular à escala do solo. A investigação auxiliará na compreensão dos eventos anteriores e posteriores ao Grande Evento de Oxidação (GEO) ocorrido há 2,5 bilhões de anos. Para inferir o mecanismo de oxidação da pirita antes do GEO foi preciso conhecer como a oxidação ocorre naturalmente nas rochas. “A pirita é o mineral de sulfeto mais abundante da crosta terrestre e sua oxidação é a chave para desvendar os ciclos de outros elementos”, explicam os autores do artigo.

Os trabalhos de campo foram realizados em uma reserva natural destinada a pesquisas na Pensilvânia, nos Estados Unidos. O solo, praticamente preservado da ação humana, é formado sobre o tipo de rocha conhecido como folhelho (ou shale, em inglês), localizada 30 metros da superfície. A partir da premissa de que a pirita reage rapidamente com o oxigênio, seja pela ação da água ou do ar, os pesquisadores estudaram o solo da região para saber qual era a variação da concentração do mineral em profundidade. “Nosso objetivo foi entender como a pirita reage debaixo da terra, a partir de um modelo que determinasse o coeficiente de difusão do oxigênio nos poros da rocha e a largura da frente de reação”, explica Reis, que precisou juntar numa mesma equação parâmetros como profundidade, velocidade de erosão e taxa de reação, entre outros, conectando escalas que variam de um milionésimo de metro a dezenas de metros.

Observar o comportamento da oxidação da pirita no subsolo é importante para entender como ocorre a acidificação da água decorrente desse processo, um antigo problema geológico e ambiental. O que o modelo demonstrou é que a erosão e a penetração do oxigênio na água infiltrada nas fissuras das rochas definem o ritmo da oxidação. A reação libera ácido sulfúrico e produz hidróxido de ferro, mas ocorre lentamente, o que explica por que as águas não se tornaram ácidas.




Reis: "A pirita é o mineral de sulfeto mais abundante da crosta terrestre e sua oxidação é a chave para desvendar os ciclos de outros elementos" (Foto: Arquivo pessoal).


O físico, que desde 2012 conta com recursos do Programa Cientista do Nosso Estado (CNE) da FAPERJ para desenvolver suas pesquisas, afirma que o apoio da Fundação, ao longo dos últimos 20 anos, tem sido fundamental, tanto para modernizar e equipar o Instituto de Física da UFF quanto para o desenvolvimento de pesquisas. Ele aplica métodos de Física Estatística a diversos sistemas para simplificar a sua dinâmica microscópica, geralmente restringindo-a aos principais processos físicos ou físico-químicos, o que permite tratar grandes números de agentes em interação. Foi entre 2013 e 2014 que Fábio Reis começou a se interessar pela Geoquímica, em especial por crescimento e dissolução de minerais. De pronto, vislumbrou que poderia aplicar os métodos e modelos que conhecia a alguns daqueles problemas. Ele entrou em contato com a professora Susan Brantley e se ofereceu para colaborar com a sua pesquisa, abrindo oportunidade para explorar uma área que até então ele desconhecia.

“Durante duas visitas, em 2014 e 2015, aprendi que modelos de transporte reativo eram mais adequados para descrever o intemperismo químico de rochas e minerais e sua relação com a evolução de solos. Usando esta metodologia, nova para mim, publicamos dois artigos, em 2017 e 2019. Foi em outra visita à Penn State, em 2018, que conheci o pos-doc Xin Gu (atualmente professor assistente naquela universidade) e que discutimos o intemperismo da pirita, que resultou no artigo publicado na versão online da prestigiosa revista Science”, relata Reis. No Brasil, o pesquisador desenvolve outros projetos de Geoquímica com o Pós-Doutorando Nota Dez da FAPERJ Ismael Carrasco, desde 2018.

O modelo proposto concluiu que sob a atmosfera atual, a taxa de oxidação da pirita é limitada pela difusão de oxigênio nos fragmentos de rocha. Confirmou, ainda, a improbabilidade da ação microbiana na oxidação, já que aqueles fragmentos têm poros de tamanho nanométrico. Já no período anterior ao GEO, a taxa de oxidação da pirita era mais lenta devido à menor concentração de oxigênio na atmosfera. Naquela época, portanto, a pirita, exposta na superfície terrestre, estava ao alcance da ação de microorganismos, que poderiam acelerar a oxidação e acidificar o ambiente. Segundo o pesquisador, o modelo por ele desenvolvido também foi aplicado a rochas de outros locais (Califórnia e Taiwan), onde são observados resultados semelhantes. “Em todos os três sítios, o modelo explica a oxidação lenta da pirita no subsolo na atmosfera atual e explica por que ela estaria exposta no solo antes do GEO”, esclarece.




Autor: Paula Guatimosim
Fonte: FAPERJ
Sítio Online da Publicação: FAPERJ
Data: 03/12/20
Publicação Original: http://www.faperj.br/?id=4122.2.3

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