segunda-feira, 30 de abril de 2018

IBGE/PNAD Contínua: Número de idosos cresce 18% em 5 anos e ultrapassa 30 milhões em 2017

A população brasileira manteve a tendência de envelhecimento dos últimos anos e ganhou 4,8 milhões de idosos desde 2012, superando a marca dos 30,2 milhões em 2017, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua – Características dos Moradores e Domicílios, divulgada hoje pelo IBGE.

Em 2012, a população com 60 anos ou mais era de 25,4 milhões. Os 4,8 milhões de novos idosos em cinco anos correspondem a um crescimento de 18% desse grupo etário, que tem se tornado cada vez mais representativo no Brasil. As mulheres são maioria expressiva nesse grupo, com 16,9 milhões (56% dos idosos), enquanto os homens idosos são 13,3 milhões (44% do grupo).

“Não só no Brasil, mas no mundo todo vem se observando essa tendência de envelhecimento da população nos últimos anos. Ela decorre tanto do aumento da expectativa de vida pela melhoria nas condições de saúde quanto pela questão da taxa de fecundidade, pois o número médio de filhos por mulher vem caindo. Esse é um fenômeno mundial, não só no Brasil. Aqui demorou até mais que no resto do mundo para acontecer”, explica a gerente da PNAD Contínua, Maria Lúcia Vieira.

Entre 2012 e 2017, a quantidade de idosos cresceu em todas as unidades da federação, sendo os estados com maior proporção de idosos o Rio de Janeiro e o Rio Grande do Sul, ambas com 18,6% de suas populações dentro do grupo de 60 anos ou mais. O Amapá, por sua vez, é o estado com menor percentual de idosos, com apenas 7,2% da população.



Autodeclaração de pretos e pardos aumenta

Outro fenômeno recente é o aumento na autodeclaração de pretos e pardos nos últimos anos. De 2012 a 2017, os dois grupos cresceram consistentemente: os pretos foram de 7,4% da população para 8,6%, enquanto os pardos saíram de 45,3% para 46,8%. Os que se dizem brancos, por outro lado, caíram de 46,6% para 43,6%.

Como são os próprios entrevistados que definem sua cor ou raça, esse fenômeno pode ser explicado em grande parte por uma mudança cultural nos últimos anos.

“Podemos explicar isso por duas hipóteses. A primeira é a miscigenação da população. A população vai casando e se reproduzindo fora de sua etnia. A segunda hipótese é a questão das políticas de afirmação, das pessoas entenderem a importância de se dizer de determinada cor e não mais dizer que é de outra. É entender a importância de sua própria origem, de sua cor ou raça”, conclui Maria Lúcia.

O estado com maior percentual de população parda é o Amazonas, com 76,7%, enquanto a Bahia é a unidade da federação com maior proporção de pretos (20,9%) e Santa Catarina é a que tem mais brancos (82,8%).


Repórter: Rodrigo Paradella
Imagem: Governo da Bahia
Arte: Marcelo Barroso


Do IBGE, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 27/04/2018



Autor: IBGE
Fonte: EcoDebate
Sítio Online da Publicação: EcoDebate
Data de Publicação: 27/04/2018
Publicação Original: https://www.ecodebate.com.br/2018/04/27/ibgepnad-continua-numero-de-idosos-cresce-18-em-5-anos-e-ultrapassa-30-milhoes-em-2017/

Energia eólica revoluciona matriz energética no Uruguai

1º na América Latina e 4º no mundo na quantidade de geração de energia elétrica coberta com fonte eólica


Parque Eólico BX. Crédito: Aguaclara


Em março, o vento venceu a água pela primeira vez. Durante o terceiro mês do ano, a energia eólica tornou-se a primeira fonte de geração de eletricidade no Uruguai, deslocando a hidráulica para o segundo lugar. Os 40,96% da energia em março foram gerados pelo vento, seguido por água com 38,77%, biomassa de resíduos florestais e casca de arroz (9%), térmica (7,65%) e fotovoltaica (4,65%) explicou o restante, de acordo com as informações disponíveis no site da empresa elétrica do país (UTE).

No fim do ano passado, foram instalados mais parques eólicos que permitiram ao país alcançar e se aproximar ainda mais das metas propostas para 2020 em energias renováveis, estabelecidas na Política Energética (2005 a 2030) da nação. Hoje, o Uruguai possui 43 centrais de geração, capazes de abastecer mais de 35% da população.

Em uma década, o Uruguai tornou-se o país com maior proporção de eletricidade gerada a partir da energia eólica na América Latina e quarto no mundo, segundo o relatório “Renovable 2017: Report Global”, elaborado pela REN 21 (Veja p. 89, na figura 29: http://www.ren21.net/wp-content/uploads/2017/06/17-8399_GSR_2017_Full_Report_0621_Opt.pdf).

Com isso, o país reduziu sua vulnerabilidade às mudanças climáticas e às crescentes secas que afetam as hidroelétricas, bem como reduzir os custos de geração e cumprir os compromissos firmados em fóruns internacionais como Paris e Marrocos.

Hoje, mais de 95% do país é abastecido com energias renováveis: hidroelétrica, solar, biomassa e eólica. Para alcançá-lo, foram investidos US $ 2.700 bilhões na mudança da matriz energética, dos quais US $ 1.800 bilhões foram destinados a infraestrutura para energia eólica.

O progresso da energia eólica no Uruguai foi feito graças a um conjunto de medidas e condições favoráveis: um esquema de benefícios fiscais, a disponibilidade de recurso eólico, processos competitivos de contratação transparentes, forte rede de infraestrutura viária, portuária e eletricidade, e fundamentalmente, um consenso político-social que garanta a continuidade e solidez do desenvolvimento energético como prioridade do Estado.


Colaboração de Fernanda Bertin, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 27/04/2018



Autor: Fernanda Bertin
Fonte: EcoDebate
Sítio Online da Publicação: EcoDebate
Data de Publicação: 27/04/2018
Publicação Original: https://www.ecodebate.com.br/2018/04/27/energia-eolica-revoluciona-matriz-energetica-no-uruguai/

Perda de massa de gelo no Ártico russo quase dobrou na última década

A perda de massa de gelo no Ártico russo quase dobrou na última década, de acordo com pesquisa da Universidade Cornell publicada na revista Remote Sensing of Environment .

A pesquisa concentrou-se em Franz Josef Land, um arquipélago russo dos mares de Kara e Barents – entre as terras mais remotas e mais setentrionais da Terra.

“As geleiras estão encolhendo por área e por altura. Estamos vendo um aumento na velocidade recente de perda de gelo, quando comparado com a taxa de perda de gelo a longo prazo”, disse o pesquisador-chefe Whyjay Zheng, doutorando em geofísica da Cornell University. “Estamos descobrindo que o gelo está mudando mais rapidamente do que pensávamos anteriormente”, disse Zheng. “A temperatura está mudando no Ártico mais rápido do que em qualquer outro lugar do mundo.”

De 1953 a 2010, a taxa média de perda de superfície do gelo foi de 18 centímetros por ano. De 2011 a 2015, a redução da superfície do gelo foi de 32 centímetros por ano, o que é uma perda de água de 4,43 gigatoneladas por ano, disse Zheng. Em termos de perspectiva, essa quantidade de água elevaria o nível do lago Cayuga – o mais longo dos lagos do Estado de Nova York, a 38 milhas – por 85 pés e inundaria as cidades de Ithaca e Seneca Falls.

O Ártico tem se aquecido nas últimas décadas, mas as geleiras em toda a região estão respondendo de maneiras diferentes. “Estudos anteriores mostraram que as geleiras no norte do Canadá parecem estar encolhendo a um ritmo mais rápido do que em algumas partes do norte da Rússia”, disse Matt Pritchard, professor de geofísica da Cornell.

“Nosso trabalho examina mais de perto as geleiras russas para entender por que elas podem estar respondendo a um aquecimento ártico diferentemente das geleiras em outras partes do Ártico. Por que os glaciares em Franz Josef Land estão encolhendo mais rapidamente, entre 2011 e 2015, está possivelmente relacionado às mudanças de temperatura oceânica “, disse Pritchard.


Na Ilha de Franz Josef Land, uma imagem do Landsat 7, à esquerda, de 17 de julho de 2002, mostra uma forte cobertura de gelo em terra e no mar ao redor. A imagem do Landsat 8, no meio, de 23 de setembro de 2013, revela muito menos a cobertura de gelo, enquanto uma imagem do Landsat 8, à direita, de 12 de setembro de 2016, ficou com menos cobertura de geleiras.


Referência:

Accelerating glacier mass loss on Franz Josef Land, Russian Arctic
Whyjay Zhenga, Matthew E. Pritcharda, Michael J. Willisb, c, Paul Tepesd, Noel Gourmelend, e, Toby J. Benhamf, Julian A. Dowdeswellf
Remote Sensing of Environment
Volume 211, 15 June 2018, Pages 357–375
https://doi.org/10.1016/j.rse.2018.04.00

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 27/04/2018



Autor: Blaine Friedlander, Cornell Chronicle
Fonte: Cornell University
Sítio Online da Publicação: EcoDebate
Data de Publicação: 27/04/2018
Publicação Original: https://www.ecodebate.com.br/2018/04/27/perda-de-massa-de-gelo-no-artico-russo-quase-dobrou-na-ultima-decada/

O avesso da história: da África ao Brasil afrodescendente

“Até que os leões inventem suas histórias, os caçadores serão sempre os heróis das narrativas de caça.” Não é por acaso que o provérbio africano já está logo na página de abertura do livro História da África e do BrasilAfrodescendente (Ed. Pallas, 407 p., 2017). Faz sentido. Para a autora, Ynaê Lopes dos Santos, professora adjunta do Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDoc), da Fundação Getúlio Vargas (FGV), a frase ilustra o enfoque com que procurou contar a história nos dois lados do Atlântico. Como explica a autora, história é construção. “Portanto, ao se mostrar a possibilidade de outros olhares, também se abre a perspectiva de novos enfoques.”

No caso da África, dada a tradição de oralidade de suas diversas culturas, os historiadores daquele continente precisaram se valer de estudos arqueológicos, linguísticos e antropológicos para traçar uma produção historiográfica que não fosse eurocêntrica. Foi nessa produção mais recente que Ynaê concentrou suas pesquisas. “Adotei no livro uma abordagem paradidática, para possibilitar a leitura por um público mais amplo e também para estabelecer pontes entre a história africana e a do Brasil, já que para cá vieram milhões de escravizados daquele continente.”

O livro foi pensado a partir da obrigatoriedade do ensino da história e da cultura afro-brasileira e africana nas escolas de Ensino Fundamental e contou com o apoio de um Auxílio Básico à Pesquisa (APQ 1), da FAPERJ. “Procurei diminuir o hiato entre o que se produz na Academia e o que era ensinado nos colégios. Afinal, o Brasil é um país cuja história foi construída por milhares de africanos e seus descendentes, homens e mulheres que durante muito tempo tiveram suas vidas e trajetórias pouco contadas ou totalmente silenciadas. Ampliar o conhecimento sobre esse passado é também uma forma de entendermos melhor o mundo e a nós mesmos. E tudo isso ajuda a construir a identidade de muitos estudantes – sobretudo os afrodescendentes – a partir de lastros históricos”, acrescenta Ynaê.


Os diversos tipos físicos dos diferentes povos africanos trazidos como escravos para o Brasil (Reprodução: Debret, Kingsley, Morel, Reclus e Rugendas)


Na época em que lecionava para alunos do Ensino Fundamental, Ynaê percebia a enorme confusão quando o assunto era a África. “A maioria vê como uma coisa só, e não como um continente com inúmeros países. Eles conhecem o Egito, mas têm dificuldade, por exemplo, em situá-lo no norte da África.” No livro, ela procura desfazer diversos desses mitos, com mapas e fotos. Para começar, ela enfatiza que nos mais de 30 milhões de km2 daquele continente – um território quase três vezes maior do que a Europa –, de acordo com dados da Organização das Nações Unidas (ONU), era possível contar, em 2015, mais de um bilhão de pessoas distribuídas por 55 países independentes.

Outro mito recorrente seria “uma maior facilidade” dos africanos em aceitar a escravidão já que muitas sociedades daquele continente a praticavam. Ela explica as enormes diferenças entre a escravidão moderna, como a que se deu não só no Brasil, mas em vários outros países das Américas até o século XIX, e a praticada nas sociedades africanas.

“Na escravidão moderna, a produção econômica, com suas plantações de produtos para exportação, dependia do trabalho escravo para funcionar, enquanto na África, o escravo era consequência de guerras ou conflitos internos e sua atuação era auxiliar o dono na roça e nos trabalhos domésticos. Mas, principalmente, não há mercado, o escravo não era considerado uma mercadoria, como para os europeus que atuavam no tráfico negreiro”, esclarece. A resistência à escravização ainda no continente africano também foi intensa. Caçados por povos inimigos ou por europeus, habitantes de aldeias inteiras fugiam para o interior. É célebre o caso da rainha Nzinga, do reino de Ndongo, na África Centro-Ocidental, que lutou bravamente contra os portugueses e ficou conhecida como uma grande guerreira.

Os que acabavam capturados e vendidos aos europeus tinham pela frente a longa travessia do chamado Calunga Grande, o oceano Atlântico. A viagem, que podia levar de 25 dias a dois ou três meses, dependendo do porto de destino, era um tormento a mais. Além das crenças, para muitos desses povos, de que o mar era a separação entre o mundo dos vivos e o dos mortos, eles vinham acomodados nos porões, em espaços que muitas vezes tinham apenas um metro de altura, o que só lhes permitia ficar sentados, enfileirados, um entre as pernas do seguinte, com permissão para subir ao convés para tomar sol, durante um breve intervalo no dia. O resultado era que boa parte dessa carga humana morria pelo caminho.


Para Ynaê Santos, a luta contra a discriminação está longe de acabar (Fonte: Divulgação)


Uma vez no Brasil, esses africanos e seus descendentes tinham diante de si uma existência de trabalho, fosse nas plantações de cana-de-açúcar, na mineração, no plantio do algodão ou do café. Mas apesar das jornadas que variavam de 12 a 18 horas, alguns escravos aprenderam a negociar com seus senhores melhores condições de vida e mais espaços de autonomia, para, por exemplo, plantar sua própria roça e melhorar a alimentação. Com isso, às vezes eles conseguiam um pequeno excedente para vender e guardar o dinheiro obtido para no futuro comprar a sonhada alforria. “Essa acabou se tornando uma prática comum nos engenhos de açúcar e fazendas de café, já que também era um negócio vantajoso para os senhores. Tornava-se um incentivo para os escravos trabalharem com maior eficiência e diminuía a possibilidade de fuga, já que eles precisariam pensar duas vezes antes de abandonar suas pequenas plantações”, fala a autora.

Nas grandes cidades, como o Rio de Janeiro, além do trabalho doméstico, os escravos eram alugados para realizar uma série variada de tarefas. Eram os escravos de ganho, que ofereciam seus serviços pelas ruas e pelo comércio em troca de pagamento, que em parte era entregue a seu senhor. Fosse na estiva, junto ao porto, trabalhando como ferreiros, reparando o calçamento das ruas, fazendo a limpeza urbana ou vendendo de galinhas a doces e angu, a população escrava na cidade era numerosa, o que costumava chamar a atenção de viajantes estrangeiros.

O fato é que entre os séculos XVI e XIX, a resistência à escravidão se manifestou de diversas formas, seja fazendo "corpo mole" nas plantações, danificando ferramentas e máquinas de trabalho, como as engrenagens de uma casa de engenho, por exemplo. Além do enorme prejuízo pelo conserto do equipamento, isso também significava vários dias de trabalho parado. Eram atitudes arriscadas e, portanto, raras, já que se descoberto, o castigo era violento, como forma de exemplo para os demais. As fugas também foram frequentes, fosse como forma de negociar melhores condições de trabalho ou mesmo para conseguir juntar-se aos mocambos ou quilombos e viver longe do cativeiro. Embora o Quilombo dos Palmares, na Capitania de Pernambuco, tenha se tornado o mais conhecido e um dos mais duradouros, a verdade é que os quilombos se multiplicaram por todo o império. No Rio de Janeiro, também ficou conhecido o Quilombo das Camélias, no que mais tarde seria conhecido como o bairro do Leblon.

“A assinatura da Lei Áurea, em 1888, apenas acabou com o cativeiro no Brasil, mas não propôs nem ofereceu alternativas para os milhares de ex-escravos que tinham obtido a liberdade”, afirma Ynaê. Da mesma forma, a proclamação da República, um ano mais tarde, também não significou qualquer mudança para os negros. “Na realidade, o novo projeto de Brasil defendido pelos republicanos entendia que a população negra era sinônimo de atraso. Para se tornar uma nação poderosa, era preciso que sua população fosse branca”, continua. Para isso, a ideia era branquear o país com levas de migrantes europeus, política que vigorou nos primeiros anos da República.

Mesmo enfrentando um enorme preconceito, alguns trabalhadores negros conseguiram se incluir no competitivo mercado de trabalho das principais cidades brasileiras, em fábricas ou em empregos informais. Alguns deles conseguiram se destacar, o que possibilitou a formação de algumas poucas famílias de classe média. Para discutir a discriminação e pensar alternativas para melhorar as condições de vida dos afro-brasileiros, trabalhadores e intelectuais negros criaram associações, grêmios, clubes e jornais. Em 1931, a Frente Negra Brasileira foi criada com o objetivo de integrar a população negra em pé de igualdade com o restante da sociedade. Rapidamente, a ela se associaram cerca de cem mil integrantes pelo País. Foi assim até 1938, quando a Frente Negra e todas as publicações da imprensa negra foram fechadas durante a ditadura Vargas.

A efervescência dos anos 1960 trouxe à tona os diferentes movimentos libertários, entre eles o Black Power americano, o reggae jamaicano e as lutas anticolonialistas na África. Os reflexos no Brasil se fizeram sentir nas décadas seguintes, com o surgimento de várias organizações de Movimento Negro pelo País, ao longo dos anos 1970 e 1980. “Embora seja inegável que inúmeras conquistas tenham sido alcançadas, como a configuração do racismo como crime inafiançável ou a lei de cotas para o ingresso de negros na universidade – também alvo de enorme polêmica –, essa luta ainda está longe de acabar”, conclui.



Autor: Vilma Homero
Fonte: Faperj
Sítio Online da Publicação: Faperj
Data de Publicação: 27/04/2018
Publicação Original: http://www.faperj.br/?id=3557.2.0

Para desmistificar o aprendizado da Química*




Godoy: professor criou projeto para tentar diminuir a distância entre os estudantes e a Química, e levar aos alunos aspectos mais atrativos e práticos da disciplina (Foto: Arquivo Pessoal)


Se houvesse um ranking das disciplinas que menos agradam aos alunos dos ensinos Médio e Fundamental, a Química provavelmente apareceria nas primeiras colocações. Mesmo estando presente em fenômenos naturais diversos, muitas vezes fascinantes, como a aurora boreal, por exemplo, e em atividades cotidianas, como o cozimento de alimentos, a necessidade de estudo da matéria pouco sensibiliza a maioria dos estudantes. Para diminuir a distância entre os estudantes e a Química, e levar aos alunos aspectos mais atrativos e práticos dessa disciplina, o professor de Química Analítica e pesquisador José Marcus Godoy, da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), que também é Cientista do Nosso Estado da FAPERJ, criou o projeto Alquimia. A proposta, que tem nome homônimo ao jogo desenvolvido pela Grow, com a anuência da marca, consiste em vídeos disponibilizados no YouTube, que demonstram, na prática, o desenvolvimento de diversas reações químicas a partir do uso do brinquedo. “Durante um período de três anos realizamos, na PUC-Rio, uma oficina para professores de Química de escolas municipais e estaduais do Ensino Médio, na qual ensinávamos esses experimentos. Entretanto, percebemos que daquela forma, o conhecimento ficava restrito a poucos. Foi assim que tivemos a ideia de filmar e disponibilizar as experiências na Internet. Dessa forma, se a escola quiser realizar com seus alunos, basta comprar o jogo Alquimia, que não é caro, e seguir as instruções no nosso canal no YouTube”, explica o professor.

Um exemplo mostrado nos vídeos são as reações de neutralização, que acontecem quando misturamos substâncias ácidas com substâncias básicas. Essas reações químicas já foram usadas como ferramenta estratégica ao longo da história. Um exemplo? Reações de neutralização estão presentes em algumas formulações da “tinta invisível”, muito utilizada durante a I Guerra Mundial para envio de mensagens secretas por espiões. Outras reações interessantes são as de precipitação que dão origem, por exemplo, às desagradáveis pedras nos ruins, ou ainda, àquelas formas horizontais pontiagudas em grutas calcárias, chamadas de estalactites e estalagmites.

Se tudo isso parece muito interessante, o ensino em sala de aula das precipitações não é nada simples. Pelo menos, aos olhos do leigo. No vídeo disponibilizado por Godoy e equipe, um aluno demonstra, na prática, como acontece esse fenômeno químico ao pingar algumas soluções em tubos de ensaio. “A sensação que fica, depois de assistir e aprender como tudo acontece, é que, afinal, não era tão complicado assim. A minha intenção é que a aula de Química seja menos abstrata e mais concreta; em outras palavras, interessante, atraente. Dessa forma, o aprendizado se torna mais fácil. Pude comprovar isso durante minha experiência como professor, lecionando, e com os depoimentos dos professores que já participaram desse projeto.”

Godoy cita outro exemplo, também apresentado em um dos vídeos, que mostra como reproduzir gás carbônico em sala de aula. Tão possível quanto simples, ele explica como criar esse gás que liberamos na respiração e que é absorvido pelas plantas, mas que, por outro lado, quando produzido em excesso, contribui para o efeito estufa. Bastam apenas umas gotinhas de hidrogeno carbonato de sódio e de ácido cítrico. Na junção dessas duas substâncias, imediatamente, começa uma efervescência que representa o desprendimento do gás carbônico. “É muito sedutor para os alunos poderem presenciar e participar de um fenômeno tão simples, mas ao mesmo tempo tão interessante. Além de ensinar as fórmulas e as reações, ainda há espaço para conversar com os estudantes assuntos muito importantes como, por exemplo, o aquecimento global”.

O químico já disponibilizou alguns vídeos no canal do projeto Alquimia e pretende seguir em frente com as filmagens. “No princípio, éramos mais amadores, mas com o auxílio da equipe da Coordenação Central de Educação à Distância (CCEAD) da PUC-Rio, formamos uma equipe que produziu e editou melhores vídeos. Agora, estamos prontos para produzir ainda mais”, destaca. “Quem sabe, em um futuro próximo, a Química venha a ser estudada e apreciada como uma matéria que é cheia de surpresas e tão presente na nossa vida e na natureza?”, finaliza o professor. Mais informações: https://www.youtube.com/channel/UCCPMV6y-mTKwsz0YtlUFn9A/videos

*Reportagem originalmente publicada em Rio Pesquisa, Ano IX, Nº 40 (Setembro de 2017)



Autor: Danielle Kiffer
Fonte: Faperj
Sítio Online da Publicação: Faperj
Data de Publicação: 26/04/2018
Publicação Original: http://www.faperj.br/?id=3558.2.6

quinta-feira, 26 de abril de 2018

Pesquisadores medem uma concentração recorde de microplástico no gelo marinho do Ártico


Foto: Stefan Hendricks

Especialistas do Instituto Alfred Wegener, do Centro Helmholtz de Pesquisa Polar e Marinha (AWI), encontraram recentemente quantidades maiores de microplástico no gelo marinho ártico do que nunca. No entanto, a maioria das partículas era microscopicamente pequena. As amostras de gelo de cinco regiões do Oceano Ártico continham até 12.000 partículas microplásticas por litro de gelo marinho. Além disso, os diferentes tipos de plástico mostraram uma pegada única no gelo, permitindo aos pesquisadores rastreá-los até possíveis fontes. Isso envolve a imensa mancha de lixo no Oceano Pacífico, enquanto, por sua vez, a alta porcentagem de tinta e partículas de náilon apontavam para a intensificação das atividades de transporte e pesca em algumas partes do Oceano Ártico. O novo estudo acaba de ser lançado na revista Nature Communications.

A equipe de pesquisadores da AWI reuniu as amostras de gelo durante três expedições ao Oceano Ártico a bordo do quebra-gelo de pesquisa Polarstern na primavera de 2014 e no verão de 2015. Elas provêm de cinco regiões ao longo do Transpolar Drift e do Estreito de Fram, que transporta gelo marinho do Ártico Central para o Atlântico Norte.

Espectrômetro infravermelho revela contaminação pesada com micropartículas

O termo microplástico refere-se a partículas de plástico, fibras, pellets e outros fragmentos com um comprimento, largura ou diâmetro variando de apenas alguns micrômetros – milésimos de milímetro – até menos de cinco milímetros. Uma quantidade considerável de microplástico é liberada diretamente no oceano pela deterioração gradual de pedaços maiores de plástico. Mas microplástico também pode ser criado em terra – por exemplo, lavando tecidos sintéticos ou abrasão de pneus de carros, que inicialmente flutuam no ar como poeira, e são soprados para o oceano pelo vento, ou encontram seu caminho através de redes de esgoto.

Para determinar a quantidade e distribuição exata de microplástico no gelo marinho, os pesquisadores da AWI foram os primeiros a analisar os núcleos de gelo camada por camada usando um espectrômetro infravermelho com transformada de Fourier (FTIR), um dispositivo que bombardeia micropartículas com luz infravermelha e usa um método matemático especial para analisar a radiação que eles refletem de volta. Dependendo de sua composição, as partículas absorvem e refletem diferentes comprimentos de onda, permitindo que toda substância seja identificada por sua impressão digital óptica.

A deriva do gelo e a impressão digital química oferecem pistas sobre as regiões de origem dos poluentes

A densidade e composição das partículas variaram significativamente de amostra para amostra. Ao mesmo tempo, os pesquisadores determinaram que as partículas de plástico não estavam uniformemente distribuídas pelo núcleo de gelo.

A equipe de pesquisadores também aprendeu, por exemplo, que os blocos de gelo, que são conduzidos nas massas de água do Pacífico da Bacia do Canadá, contêm concentrações particularmente altas de partículas de polietileno. O polietileno é, acima de tudo, usado em material de embalagem. Como os especialistas escrevem em seu estudo, “Assim, supomos que esses fragmentos representam restos do chamado Great Pacific Garbage Patch e são empurrados ao longo do Estreito de Bering e no Oceano Ártico pelo influxo do Pacífico”.

Em contraste, os cientistas encontraram predominantemente partículas de tinta da tinta do navio e resíduos de nylon das redes de pesca no gelo dos mares marginais da Sibéria. “Essas descobertas sugerem que tanto a expansão das atividades de navegação quanto as de pesca no Ártico estão deixando sua marca. As altas concentrações de microplásticos no gelo do mar podem, portanto, ser atribuídas não apenas a fontes fora do Oceano Ártico. Em vez disso, eles também apontam para a poluição local no Ártico ”, diz Ilka Peeken.

Os pesquisadores descobriram um total de 17 tipos diferentes de plástico no gelo do mar, incluindo materiais de embalagem como polietileno e polipropileno, mas também tintas, nylon, poliéster e acetato de celulose, este último é usado principalmente na fabricação de filtros de cigarro. Em conjunto, estes seis materiais representaram aproximadamente metade de todas as partículas de microplástico detectadas.

Os pesquisadores ainda não sabem se as partículas de plástico liberadas subsequentemente permanecem no Ártico ou se são transportadas mais para o sul; na verdade, parece provável que a areia plástica comece a afundar em águas mais profundas com relativa rapidez. “Partículas microplásticas flutuantes são frequentemente colonizadas por bactérias e algas, o que as torna mais pesadas e pesadas. Às vezes eles se juntam com algas, o que os faz cair para o fundo do mar muito mais rápido ”, explica a bióloga e coautora da AWI, Dra. Melanie Bergmann.

As observações feitas por pesquisadores da rede de águas profundas da AWI HAUSGARTEN no Estreito de Fram dão um peso adicional a essa tese. Como Melanie Bergmann relata, “Recentemente registramos concentrações de microplásticos de até 6500 partículas por quilograma de fundo do mar; esses são valores extremamente altos ”.

Referência:

Ilka Peeken, Sebastian Primpke , Birte Beyer, Julia Guetermann, Christian Katlein, Thomas Krumpen, Melanie Bergmann, Laura Hehemann, Gunnar Gerdts: Arctic sea ice is an important temporal sink and means of transport for microplastic, Nature Communications, DOI: 10.1038/s41467-018-03825-5
https://www.nature.com/articles/s41467-018-03825-5


* Tradução e edição de Henrique Cortez, EcoDebate.

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 26/04/2018



Autor: Henrique Cortez
Fonte: EcoDebate
Sítio Online da Publicação: EcoDebate
Data de Publicação: 26/04/2018
Publicação Original: https://www.ecodebate.com.br/2018/04/26/pesquisadores-medem-uma-concentracao-recorde-de-microplastico-no-gelo-marinho-do-artico/

Benefícios da alimentação orgânica, artigo de Roberto Naime


Foto: EBC

A produção de orgânicos otimiza recursos naturais e socioeconômicos, além de respeitar a cultura das comunidades rurais e melhorar a saúde

Alimentos orgânicos são produzidos através de técnicas específicas, buscando otimizar recursos naturais e socioeconômicos, respeitar a cultura das comunidades rurais, objetivando a sustentabilidade econômica e ecológica e a minimização do uso de energias não-renováveis. Sem nunca empregar materiais sintéticos, organismos modificados geneticamente ou radiações ionizantes.

Nas últimas décadas houve um crescimento muito grande com relação à preocupação com a saúde e por isto as pessoas começaram a se mobilizar em busca de dietas alimentares mais saudáveis. Esta mudança de comportamento fez crescer o número de produtores de alimentos orgânicos.

Ao contrário dos alimentos convencionais, os produtos orgânicos utilizam técnicas específicas, que respeitam o meio ambiente durante todo o seu processo de produção e objetivam maximizar os resultados obtidos com as interações sinérgicas dos elementos bióticos e abióticos constituintes dos ecossistemas utilizados.

São alimentos obtidos de maneira mais natural, e por isso são mais saudáveis e até mais saborosos e nutritivos. Além das frutas, verduras, legumes, grãos e ovos, vem sofrendo incremento também o mercado de carnes orgânicas.

Na produção de ovos e carnes, o cuidado com o rebanho ou a granja é grande, já que os animais não sofrem maus-tratos e não passam por estresse. A alimentação deles é feita com grãos, cereais, sementes, verduras e legumes orgânicos e os animais são criados sem a aplicação de hormônios, anabolizantes e antibióticos. Assim, os ovos e as carnes orgânicas são mais saudáveis.

Nos grandes centros urbanos, por exemplo, os alimentos orgânicos são encontrados à venda em “Feiras Orgânicas” ou “Feiras Verdes”, que vendem exclusivamente produtos orgânicos. Já nas “feiras livres”, as barracas de orgânicos ainda são em menor número.

Vale ressaltar que apesar de serem alimentos orgânicos, o cuidado com a higiene deve ser o mesmo que os alimentos convencionais. Os alimentos orgânicos crus, também devem ser bem lavados e em água corrente, pois da mesma forma, há o risco de contaminação por bactérias, fungos e coliformes fecais.

No Brasil, existe produção orgânica ou natural de cana-de-açúcar e açúcar; e de grãos como soja, cacau, arroz, café e gengibre, e frutas como guaraná, manga, morango, uva, pêssego, banana, frutas cítricas. São produzidos ainda rapadura orgânica e hortifrutigranjeiros como tomate orgânico e legumes. Também néctares e sucos de frutas, geleias e cosméticos.

Os orgânicos evitam problemas de saúde causados pela ingestão de substâncias químicas tóxicas. Pesquisas e investigações tem demonstrado que os agrotóxicos são prejudiciais ao nosso organismo e os resíduos que permanecem nos alimentos podem provocar reações alérgicas, respiratórias, distúrbios hormonais, problemas neurológicos e até câncer.

Alimentos orgânicos são mais nutritivos. Solos ricos e balanceados com adubos naturais produzem alimentos com maior valor nutritivo. Alimentos orgânicos também são mais saborosos. Seu sabor e aroma são mais intensos e em sua produção não há agrotóxicos ou produtos químicos que possam produzir alterações e modificações.

Protege as presentes e futuras gerações de contaminação química. A intensa utilização de produtos químicos na produção de alimentos afeta o ar, o solo, a água, os animais e as pessoas. A agricultura orgânica exclui o uso de fertilizantes, agrotóxicos ou qualquer produto químico; e tem como base de seu trabalho a preservação dos recursos naturais.

A agricultura orgânica evita a erosão do solo. Através das técnicas orgânicas tais como rotação de culturas, plantio consorciado, compostagem e outras, os solos se mantém férteis e permanecem produtivos de forma permanente.

A agricultura e a pecuária orgânicos, protegem a qualidade da água. Os agrotóxicos, ou hormônios, antibióticos e anabolizantes utilizados nas plantações e criações, não contaminam os solos e os recursos hídricos, não poluindo rios e lagos.

A agricultura e a criação orgânicos, restauram a biodiversidade, protegendo a vida animal e vegetal. A agricultura orgânica respeita o equilíbrio da natureza, criando ecossistemas saudáveis dos quais sinergicamente também se beneficia. A vida silvestre, parte essencial do estabelecimento agrícola é preservada e áreas naturais são conservadas.

Em sua maior parte, a produção orgânica provém de pequenos núcleos familiares que tem na terra a sua única forma de sustento. Mantendo o solo fértil por muitos anos, o cultivo orgânico prende o homem à terra e revitaliza as comunidades rurais.

O cultivo orgânico economiza energia, dispensa os agrotóxicos e adubos químicos, utilizando intensamente a cobertura morta, a incorporação de matéria orgânica ao solo e o trato manual dos canteiros. É o procedimento contrário da agricultura convencional que se apoia no petróleo como insumo de agrotóxicos e fertilizantes e é a base para a intensa mecanização que a caracteriza.

Por fim, o produto orgânico é certificado. A qualidade do produto orgânico é assegurada por um Selo de Certificação. Este Selo é fornecido pelas associações de agricultura orgânica ou por órgãos certificadores independentes, que verificam e fiscalizam a produção de alimentos orgânicos desde a sua produção até a comercialização.

O Selo de Certificação é a garantia do consumidor de adquirir produtos mais saudáveis e isentos de qualquer resíduo tóxico. São com gestos pequenos, concretos e persistentes que se determinam mudanças de paradigmas realmente relevantes.

Referência:

http://espacovivamais.com.br/mais-saude/os-beneficios-da-alimentacao-organica-para-saude-e-o-meio-ambiente.html


Dr. Roberto Naime, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em Geologia Ambiental. Integrante do corpo Docente do Mestrado e Doutorado em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale.

Sugestão de leitura: Civilização Instantânea ou Felicidade Efervescente numa Gôndola ou na Tela de um Tablet [EBook Kindle], por Roberto Naime, na Amazon.

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 26/04/2018



Autor: Henrique CortezFonte: EcoDebate
Sítio Online da Publicação: EcoDebate
Data de Publicação: 26/04/2018
Publicação Original: https://www.ecodebate.com.br/2018/04/26/beneficios-da-alimentacao-organica-artigo-de-roberto-naime/

Câmara aprova MP que cria fundo com recursos de compensação ambiental. A medida segue para apreciação do Senado

Mesmo após tentativa de parlamentares da oposição em impedir a votação, o plenário da Câmara dos Deputados aprovou, na madrugada desta quinta-feira (26), o projeto de lei de conversão da Medida Provisória 809/17, que autoriza o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) a selecionar sem licitação um banco público para criar e gerir fundo formado pelos recursos arrecadados com a compensação ambiental. A medida segue para apreciação do Senado.

“Uma vez que há unidades de conservação beneficiárias de compensações ambientais decorrente de diversos empreendimentos, a centralização dos recursos em um único fundo permite aquisições em maior escala e, consequentemente, a um menor custo, além de garantir que o gerenciamento da execução seja mais célere e eficiente”, explica o documento.

Ao final da sessão, foi aprovado destaque que retirou do texto final aprovado a regra que estabelecia a aplicação máxima de 60% dos recursos da compensação ambiental na regularização fundiária de unidades de conservação.

A compensação ambiental é um mecanismo financeiro criado para contrabalançar os impactos ambientais previstos ou já ocorridos na implantação de empreendimentos como uma hidrelétrica. É uma indenização paga pelos empreendedores pela degradação e que incorpora os custos sociais e ambientais identificados no processo de licenciamento.

Pela regra anterior, cabia às empresas executarem diretamente as atividades de compensação nas unidades de conservação indicadas. Segundo o presidente do ICMBio, Ricardo Soavinski, a norma era de difícil aplicação, pois geralmente era exigido o cumprimento de uma lista grande de atividades necessárias para a implantação de uma unidade, mas o empreendedor nem sempre tem expertise para realizar a compensação diretamente.

Com a modificação da Lei 11.516/2017, o ICMBio passa a ter a possibilidade de declarar, para fins de desapropriação, a utilidade pública ou o interesse social das áreas particulares inseridas nos limites das unidades de conservação ambiental.

A MP também aumentou de seis meses para dois anos o prazo de contratação de brigadistas em unidades de conservação administradas pelo ICMBio e ampliou o escopo de atividades que eles podem exercer nas unidades. Todos os anos, o órgão contrata cerca de mil brigadistas.


Por Heloisa Cristaldo, da Agência Brasil, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 26/04/2018



Autor: Heloisa Cristaldo
Fonte: Agência Brasil
Sítio Online da Publicação: EcoDebate
Data de Publicação: 26/04/2018
Publicação Original: https://www.ecodebate.com.br/2018/04/26/beneficios-da-alimentacao-organica-artigo-de-roberto-naime/

Gripes H2N3 e H3N2: virologista esclarece dúvidas sobre os tipos de vírus em circulação

Tradicionalmente, o inverno é tempo de gripe e de problemas respiratórios. A chegada da estação, em junho, traz com ela o aumento do número de casos de adoecimento provocados pelo vírus Influeza. Em 2018, porém, têm causado preocupação boatos que circulam nas redes sociais e apontam a entrada no Brasil de um sorotipo responsável por milhares de casos nos Estados Unidos, o H3N2, e ocorrência de óbitos associados a outro sorotipo do vírus, o H2N3.

Em nota oficial, no entanto, o Ministério da Saúde já esclareceu que não existe circulação de vírus Influenza H2N3 no Brasil. A entidade reforçou que mantém vigilância sobre as variantes de Influenza presentes no país, a partir de uma rede de unidades sentinelas, e destacou que a vacina anualmente oferecida pelo Sistema Único de Saúde (SUS) protege contra as variações mais comuns em circulação dos vírus Influenza H1N1, H3N2 e Infleunza B. A campanha de vacinação de 2018 teve início na última segunda-feira (23/4).

Em entrevista para o Portal Fiocruz, o virologista Fernando Motta, pesquisador do Laboratório de Vírus Respiratórios e do Sarampo do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), reforçou que a variante H2N3 não circula entre a população humana e explicou detalhes sobre a disseminação do vírus Infleunza A (H3N2) em nosso território.



O que é o vírus H3N2 e quais os sintomas da gripe que ele provoca?

Fernando Motta (IOC/Fiocruz): O vírus H3N2 é um dos subtipos do vírus influenza A, por isso chamamos de influenza A(H3N2). Os sintomas provocados por este vírus são os clássicos da clínica de gripe: febre alta com início agudo, cefaleia, dores articulares, constipação nasal e inflamação de garganta e tosse. Em alguns casos pode haver vômito e diarreia, sendo estas manifestações pouco frequentes e mais comuns em crianças.

Quais são as cepas de Influenza mais associadas aos casos de "gripe comum" no Brasil? O H3N2 é uma delas?

Todos os anos, as epidemias de influenza são provocadas por variantes de três vírus principais, dois do tipo A: influenza A(H1N1)pdm09 e A(H3N2), e o influenza B, que não tem subtipos. Estes são os vírus que circulam na população humana, podendo haver maior circulação de um ou de outro. O vírus H3N2 tem circulado de modo preponderante desde 2015 no Brasil e no mundo. Por ser um vírus que há décadas adaptado à população humana, ele apresenta um perfil clássico de acometimento de pessoas nos extremos de faixa etária, crianças e idosos, que podem apresentar complicações com necessidade de internação.

Então a entrada no H3N2 no Brasil não é inédita?

Na verdade, os vírus do subtipo H3N2 são bem conhecidos da população humana, em todos os países, inclusive nos EUA e no Brasil. São considerados sazonais desde a pandemia de 1968 (gripe de Hong Kong), quando foram introduzidos na população humana. Logo, são os vírus influenza mais bem adaptados, após quatro décadas de convivo com o ser humano. Não há ineditismo, nesse sentido.

Na sua visão, no que se refere à circulação desse vírus, há motivo para mais preocupação do que nos invernos anteriores?

Apesar de conhecido, a cada ano pequenas mutações podem gerar alterações nos vírus e dar origem a cepas com diferentes comportamentos. Cada epidemia deve ser acompanhada nas diferentes regiões do país. Porém não há motivo para alarmes. A rede de vigilância de Influenza do Ministério da Saúde acompanha semanalmente os casos e a evolução dos vírus de modo a estar apto a intervir no caso de uma mudança de cenário. Enquanto referência nacional em Influenza junto ao Ministério da Saúde, nosso Laboratório atua diretamente nessas atividades de monitoramento.

Então a variante em circulação do vírus H3N2 não é mais agressiva do que o normal?

Trata-se apenas de um boato. Não há qualquer evidência nesse sentido.

O vírus H3N2 poderia causar uma pandemia como a do Infleunza A (H1N1) em 2009?

O vírus H3N2 foi introduzido há décadas na população humana por um processo similar ao que ocorreu em 2009, em um evento de abrangência global – em uma pandemia. A transmissão dos dois é a mesma e o H3N2 só provocaria uma nova pandemia se ocorresse a recombinação de material genético oriundo de uma variante de influenza não humano (por exemplo, se ocorresse um rearranjo genético com amostras de influenza suínas ou aviárias).

Outro boato em circulação, desmentido pelo Ministério da Saúde, fala sobre casos associados ao Influenza H2N3 no Brasil. Esse vírus pode identificar populações humanas?

Não. Isso também não passa de boato. O vírus H2N3 é outro subtipo do vírus influenza A. No entanto, sua circulação está restrita a animais. Nunca foi identificado em humanos em nenhuma região do mundo.

Boatos como esse sempre causam medo de uma pandemia na população. Você poderia explicar como esse tipo de episódio acontece?

Novas cepas do vírus influenza que aparecem em pandemias tiveram algum tipo de rearranjo genético, a partir da mistura entre vírus. Isso pode ocorrer no processo de replicação do vírus quando um mamífero (uma pessoa ou um animal) está infectado por mais de um vírus de Influenza ao mesmo tempo: nesse caso, a célula infectada pode misturar o material genético dos vírus, dando origem a um novo vírus. Isso é diferente do processo de evolução que os vírus Influenza estão constantemente sofrendo, pequenas mutações que ocorrem naturalmente no ambiente e não são capazes de gerar um vírus com potencial pandêmico.

A vacina contra a gripe oferecida pelo SUS no Brasil imuniza contra os vírus de gripe mais comuns em circulação? O Infleunza H3N2 está entre eles?

Sim. A vacina oferecida no Sistema Único de Saúde (SUS) prevê cepas dos subtipos A(H1N1, A(H3N2) e B, ajustadas para serem as mais próximas possíveis dos vírus circulantes na população. Por isso, é importante a vacinação a cada nova campanha, para sempre se estar imunizado com o vírus mais próximo possível daqueles circulantes no país.

Quem tomou a vacina no ano passado ou nos anos anteriores deve se vacinar novamente contra a gripe?

Sim. As vacinas são atualizadas para cada epidemia, e mesmo que apenas um componente seja alterado é importante a renovar a vacinação. Outro aspecto desejado com a nova vacinação é o efeito de 'boost' provocado pela nova vacina, reforçando as defesas ativadas no ano anterior.

A campanha de vacinação é indicada para idosos acima de 60 anos, crianças entre seis meses e cinco anos, gestantes, mulheres até 45 dias após o parto, trabalhadores de saúde, povos indígenas, portadores de doenças crônicas e professores da rede pública e particular. Quem não está nesses grupos, como deve se prevenir?

A vacina pode ser tomada por toda a população salvo contra indicação médica ou alergia a componentes da vacina (a vacina é produzida em ovos). Ela é oferecida pelo Sistema Único de Saúde, gratuitamente, nos postos de saúde. Também pode ser encontrada em clínicas especializadas. Nesse caso, é importante estar atento para a validade do produto e se realmente tem a composição recomendada pela OMS para aquele ano epidêmico. Para todas as pessoas, a recomendação de prevenção é lavar constantemente as mãos com água e sabão, cobrir a boca ao tossir, evitar o contato com pessoas doentes e aglomerações.

Qual é o tratamento indicado para a gripe do H3N2?

O subtipo H3 segue a mesma recomendação preconizada para todos os influenza sazonais humanos. Acompanhamento de suporte pra casos sem complicação e sendo necessário, internação e uso de medicamento antiviral específico.


Autor: Marcelo Garcia
Fonte: Portal Fiocruz
Sítio Online da Publicação: Fiocruz
Data de Publicação: 25/04/2018
Publicação Original: https://portal.fiocruz.br/noticia/gripes-h2n3-e-h3n2-virologista-esclarece-duvidas-sobre-os-tipos-de-virus-em-circulacao

Educação musical e territórios saudáveis em favelas é tema de seminário (27/4)



De que forma a autonomia criativa (crítica e propositiva) pode ser incentivada na educação musical e quais os efeitos dessa abordagem para pessoas que residem em territórios de favela? Se é verdade que a educação assume um papel decisivo na emancipação de indivíduos e grupos sociais em relação a contextos de opressão, quais experiências podem ser inspiradoras partindo desses espaços? No dia 27/4 (sexta-feira), a Coordenação de Cooperação Social, a RedeCCAP e a Escola de Música da UFRJ convidam o público para uma tarde de reflexão no seminário Educação Musical e Territórios Saudáveis nas Favelas que acontecerá no auditório do Museu da Vida, campus Manguinhos da Fiocruz, de 13h às 16h30. A entrada é franca e haverá emissão de certificados.

A Escola de Música de Manguinhos (EMM) existe desde 2008 e é uma iniciativa da RedeCCAP (Rede de Empreendimentos Sociais para o Desenvolvimento Socialmente Justo, Democrático, Integrado e Sustentável), que há 32 anos é atuante em Manguinhos. O acúmulo gerado pelo processo de construção compartilhada da proposta pedagógica da Escola entre as instituições envolvidas é o foco do debate nessa sexta-feira. Ao longo do dia, estudantes da Escola de Música de Manguinhos farão intervenções musicais e compartilharão seus depoimentos sobre a experiência de educação que ajudam a construir cotidianamente.

As três instituições parceiras - RedeCCAP, a Escola de Música da UFRJ e a Coordenação de Cooperação Social da Fiocruz – atuam conjuntamente na formulação de ações estruturantes no campo da educação musical e experimentação artística, estimulando o olhar crítico das crianças, jovens e adultos participantes, bem como do corpo docente e equipe de apoio técnico.

A partir da experiência de educação musical da Escola de Música de Manguinhos (EMM), serão debatidas as metodologias, os paradigmas político-pedagógicos, as inovações e o aprendizado experienciado ao longo da década de existência da EMM. O apoio à Escola e o convênio com a RedeCCAP estão relacionados à meta Território, arte e saúde do Programa de Promoção de Territórios Saudáveis da Coordenação de Cooperação Social da Fiocruz.

Programação

13h - Mesa de abertura com representantes da Presidência da Fiocruz; Coordenação de Cooperação Social; Museu da Vida/Casa de Oswaldo Cruz; Pró-reitoria de Extensão da UFRJ; RedeCCAP

14h - Mesa de debate: “A experiência da Escola de Música de Manguinhos como promotora de cidadania”

- “EMM: território, seus atores e as costuras musicais”
Elizabeth Campos, Diretora da RedeCCAP, Coordenadora da Escola de Música de Manguinhos

- “Para que ensinar música em Manguinhos?”
João Miguel, Professor da Escola de Música/UFRJ, Coordenador pedagógico da EMM

- “Arranjos musicais para criar Territórios Saudáveis”
Felipe Eugênio, Coordenação de Cooperação Social da Presidência da Fiocruz

16h30 - Coquetel de encerramento



Autor: Luiza Gomes
Fonte: Cooperação Social da Fiocruz
Sítio Online da Publicação: Fiocruz
Data de Publicação: 25/04/2018
Publicação Original: https://portal.fiocruz.br/noticia/educacao-musical-e-territorios-saudaveis-em-favelas-e-tema-de-seminario-27-4

Pela 1ª vez, cientistas observam mega fusão de 14 galáxias ao mesmo tempo



Representação artística das 14 galáxias observadas no universo distante. Essas estruturas devem se fundir com o tempo, afirmam pesquisadores (Foto: NRAO/AUI/NSF; S. Dagnello)

Uma equipe internacional de cientistas descobriu uma concentração de 14 galáxias que estão prestes a se fundir. A megafusão foi publicada nesta quarta-feira (25) na revista "Nature" e está localizada a 12,4 bilhões de anos-luz de distância. Pela 1ª vez, cientistas conseguiram observar o processo em formação.

A aglomeração deve se tornar um dos elementos mais massivos do universo moderno, sendo 10 trilhões de vezes superior à massa do Sol. Ainda, galáxias dentro do aglomerado estão produzindo estrelas a um ritmo incrível, relatam os autores. Algumas das 14 galáxias estão formando estrelas até 1.000 vezes mais rápido do que a Via Láctea.

"Com o tempo, as 14 galáxias que observamos irão parar de formar estrelas e se aglutinar em uma única galáxia gigantesca", afirmou Scott Chapman, astrofísico da Universidade Dalhousie (Canadá), em nota.

"O fato de que isso está acontecendo tão cedo na história do universo representa um desafio para a nossa compreensão atual do modo como as estruturas se formam", continuou o especialista.

Cientistas pontuam que, na história do universo, a matéria começou a se aglomerar em concentrações cada vez maiores, dando origem às galáxias. Já as aglomerações de galáxias, por sua vez, são conhecidas como "protoclusters" e modelos computacionais atuais indicavam que aglomerados tão grandes quanto os observados agora poderiam ter demorado muito mais para evoluir.

"Como essa galáxia ficou tão grande tão rapidamente é um mistério", diz Tim Miller, candidato a doutorado na Universidade de Yale (EUA) e coautor do estudo, em nota.

Os astrônomos perceberam que as galáxias estão em processo de fusão pela alta massa em um espaço confinado. Um outro ponto é a alta taxa de formação de estrelas, que fornece evidências para a fusão.


Importância do achado



A observação desses processos no universo podem fornecer descobertas interessantes para a ciência. É sabido, por exemplo, que esses aglomerados de galáxias transbordam um gás superaquecido que pode atingir temperaturas de 1 milhão de graus celsius.

Uma hipótese apresentada para o porquê de haver esse gás é que, com a velocidade de formação das estrelas nesse aglomerado, há a emissão de gás quente. Como esse gás não é denso o suficiente para formar estrelas, ele acaba sendo emitido dentre os espaços vazios nas galáxias.

A observação do aglomerado de galáxias foi possível com a utilização do radiotelescópio ALMA (Atacama Large Millimeter/submillimeter Array). Localizado no deserto do Atacama (Chile), o instrumento foi construído por meio de uma colaboração internacional e é atualmente o maior radiotelescópio do mundo.



Autor: G1 Globo
Fonte: G1 Globo
Sítio Online da Publicação: G1 Globo
Data de Publicação: 25/04/2018
Publicação Original: https://g1.globo.com/ciencia-e-saude/noticia/pela-1-vez-cientistas-observam-mega-fusao-de-14-galaxias-ao-mesmo-tempo.ghtml

quarta-feira, 25 de abril de 2018

Estudo indica que o aquecimento global intensificará as secas na Europa

O aquecimento global exacerbará as secas na Europa – as secas durarão mais, afetarão áreas maiores e terão impacto sobre mais pessoas. Se a Terra se aquecer em três graus Celsius, os eventos extremos – como a seca que atingiu grande parte da Europa em 2003 – poderão se tornar o estado normal no futuro.

Este cenário foi descrito na revista científica Nature Climate Change por uma equipe internacional de autores composta por cientistas coordenados pelo Centro de Pesquisa Ambiental de Helmholtz (UFZ). Pela primeira vez, os pesquisadores explicaram como um aumento de temperatura global de um a três graus Celsius pode ter um impacto significativo na distribuição das secas em toda a Europa.

De acordo com os resultados da modelagem da equipe de autores – que envolveu cientistas dos EUA, Holanda e Reino Unido, além da UFZ – se o aquecimento global subir três graus, as regiões secas da Europa se expandirão de 13% para 26%. da área total em comparação com o período de referência de 1971 a 2000. Se os esforços forem bem sucedidos em limitar o aquecimento a 1,5 grau Celsius, conforme estipulado no Acordo de Proteção Climática de Paris, as regiões da seca na Europa podem ser limitadas a 19% da área total . Com exceção da Escandinávia, a duração das maiores secas na Europa também durará três a quatro vezes mais do que no passado. Até 400 milhões de pessoas poderiam ser afetadas.

Conseqüências negativas podem ser esperadas para a região do Mediterrâneo, onde as regiões secas podem se expandir de 28% da área no período de referência para 49% da área nos casos mais extremos. O número de meses de seca por ano também aumentará significativamente no Sul da Europa: “No caso de um aquecimento de três graus, presumimos que haverá 5,6 meses de seca por ano; até agora, o número foi de 2,1 meses. Em partes da Península Ibérica, projetamos que a seca poderia durar mais de sete meses “, diz o hidrólogo da UFZ, Dr. Luis Samaniego, um dos dois principais autores do estudo.

Se o cenário de três graus ocorrer, os eventos de seca dessa intensidade e extensão podem, portanto, ocorrer duas vezes mais em anos à frente e se tornar o estado normal em muitas partes da Europa. No futuro, as secas até excedem em muito esse estado normal; o impacto sobre a sociedade civil e a economia seria severo. Isso corresponde aproximadamente ao déficit hídrico experimentado durante o período de seca que prevaleceu no verão de 2003 em grande parte da Europa.

Se, por outro lado, o aquecimento global aumentar apenas 1,5 graus Celsius, apenas 3,2 meses de seca poderiam ser esperados anualmente na região do Mediterrâneo e haveria um declínio no teor de água no solo de cerca de oito milímetros.

Segundo os cientistas da UFZ, outras regiões da Europa não seriam afetadas tão severamente quanto a região do Mediterrâneo – mesmo se a temperatura subir três graus Celsius. “Nas regiões Atlântica, Continental e Alpina, as áreas secas vão aumentar menos de dez por cento da área total”, explica o matemático Stephan Thober.

Por outro lado, nos estados bálticos e na Escandinávia, os aumentos projetados na precipitação desencadeada pelo aquecimento global poderiam até mesmo fazer com que a área afetada pela seca diminuísse cerca de 3%. Também para a Alemanha, o aquecimento teria apenas consequências relativamente menores – com uma restrição: “Aqui também os verões ficariam mais secos no futuro do que até agora”, diz Thober.

Os pesquisadores da UFZ também enfatizam que a humanidade pode reagir à esperada disseminação de secas. A maneira mais certa seria implementar os objetivos de proteção climática do Acordo de Paris e, assim, reduzir os efeitos negativos sobre as secas terrestres na Europa.


O teor de água no solo, com uma profundidade de dois metros, diminuiria em 35 milímetros se a temperatura global aumentasse em 3 graus Celsius. Isso corresponde a um déficit hídrico de 35.000 metros cúbicos de água por quilômetro quadrado. Ilustrando simbolicamente essa mudança na paisagem, corresponde a um depósito de água com uma altura de 3,5 me comprimento e largura de 100 m em cada quilômetro quadrado. Foto: Peisker, fotolia; montagem: Martin Schrön, UFZ


Referência:

L. Samaniego, S. Thober, R. Kumar, N. Wanders, O. Rakovec, M. Pan, M. Zink, J. Shef?eld, E. F. Wood, and A. Marx (2018): Anthropogenic warming exacerbates European soil moisture droughts. Nature Climate Change http://dx.doi.org/10.1038/s41558-018-0138-5


* Tradução e edição de Henrique Cortez, EcoDebate.

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 25/04/2018



Autor: Henrique Cortez
Fonte: EcoDebate
Sítio Online da Publicação: EcoDebate
Data de Publicação: 25/04/2018
Publicação Original: https://www.ecodebate.com.br/2018/04/25/estudo-indica-que-o-aquecimento-global-intensificara-as-secas-na-europa/

Poluentes de vida curta ameaçam clima, saúde e produção agrícola na América Latina, diz relatório da ONU Meio Ambiente

Até 2050, se adotarem medidas para combater os poluentes de vida curta, países da América Latina e do Caribe poderão reduzir em 0,9ºC o aumento da temperatura regional.

A estimativa é de um relatório divulgado neste mês (19) pela ONU Meio Ambiente, que alerta para os riscos à saúde, à natureza e à produção agrícola de substâncias como o metano, o carbono negro, os hidrofluorocarbonos (HFC) e o ozônio.




Na imagem, poluição atmosférica na cidade de São Paulo. Foto: Flickr/Thomas Hobbs (cc)

Até 2050, se adotarem medidas para combater os poluentes de vida curta, países da América Latina e do Caribe poderão reduzir em 0,9ºC o aumento da temperatura regional. A estimativa é de um relatório divulgado neste mês (19) pela ONU Meio Ambiente, que alerta para os riscos à saúde, à natureza e à produção agrícola de substâncias como o metano, o carbono negro, os hidrofluorocarbonos (HFC) e o ozônio.

A pesquisa da agência das Nações Unidas aponta que reduções desses compostos químicos poderiam provocar uma queda de 26% no número de mortes prematuras causadas pela poluição do ar por partículas finas. Quando considerados os óbitos associados à contaminação por ozônio, o índice poderia chegar a 40%.

A ONU Meio Ambiente estima que, em 2010, 64 mil pessoas morreram na América Latina e no Caribe devido à exposição a esses materiais.

Estratégias para mitigar os poluentes de vida curta também permitiriam evitar perdas anuais de 3 a 4 milhões de toneladas de cultivos básicos.

De acordo com o levantamento, em 2010, o ozônio foi responsável por um prejuízo de 7,4 milhões de toneladas em produtos agrícolas, como soja, milho, trigo e arroz.

Segundo a análise da ONU, até 2050, a mortalidade prematura, associada às partículas finas e ao ozônio, poderá dobrar. Já as perdas da agricultura poderão alcançar 9 milhões de toneladas por ano.
Ozônio

O ozônio é um gás que se forma tanto nas altas camadas da atmosfera (a estratosfera), como nas baixas (a troposfera). Na estratosfera, a substância protege a vida terrestre da radiação ultravioleta do sol. Mas na troposfera, ela atua como um poluente perigoso. O ozônio é um dos principais componentes de névoa urbana e o terceiro maior causador do aquecimento global, atrás apenas do metano e do gás carbônico. Pesquisas associaram o contato com a substância a índices mais altos de infartos, acidentes vasculares cerebrais, doenças cardiovasculares e problemas reprodutivos e de desenvolvimento. O gás também reduz o rendimento das safras e a qualidade e produtividade das plantações.

Podendo permanecer na atmosfera desde horas até dias, o ozônio é considerado um poluente secundário, pois não é emitido diretamente por uma atividade humana. Na verdade, a substância se forma quando gases precursores, como o metano, o monóxido de carbono e o óxido de nitrogênio, reagem na presença da luz solar. Por isso, é tão importante reduzir as emissões de metano.



A ONU Meio Ambiente lembra que o potencial de aquecimento atmosférico dos poluentes de vida curta é bem mais alto que o do gás carbônico, podendo atingir um valor mil vezes maior que a taxa atribuída ao dióxido de carbono.

A agricultura, o transporte e a refrigeração doméstica e comercial são, respectivamente, os maiores responsáveis pelas emissões de metano; carbono negro e partículas tóxicas finas; e hidrofluorocarbonos.
Soluções

O relatório das Nações Unidas apresenta medidas para diminuir as emissões desses compostos que desregulam o clima e ameaçam a vida no planeta.

Para combater o metano, são necessárias mudanças em quatro setores-chave – produção e distribuição de petróleo e gás, gestão de resíduos, mineração de carvão e agricultura. A pesquisa recomenda práticas de captura e uso dos gases liberados na produção de petróleo e gás; separação e tratamento dos resíduos sólidos municipais que sejam biodegradáveis; e captura do biogás proveniente do esterco do gado.

Até 2050, estratégias poderiam reduzir em 45% as emissões de metano.
Metano

O metano é o segundo gás com maior impacto sobre o aquecimento do planeta, depois do gás carbônico. A América Latina e o Caribe respondem por aproximadamente 15% de todas as emissões dessa substância. Quase todo o metano liberado na atmosfera vem de três setores: agricultura (cerca de 50%); produção e distribuição de carvão, petróleo e gás (em torno de 40%); e gestão de resíduos (por volta de 10%). O gás permanece na atmosfera por aproximadamente 12 anos e é considerado um importante precursor do ozônio.



O volume de carbono negro liberado nos países latino-americanos e caribenhos também pode ter queda considerável – de 80% – até 2050. Para isso, governos devem adotar normas equivalentes ao padrão europeu para regular os veículos a diesel, além de incorporar filtros para as partículas liberadas pelo combustível nesses automóveis.

Outras iniciativas exigidas são a eliminação dos veículos de altas emissões; a modernização de cozinhas e estufas; e a proibição da queima a céu aberto de resíduos agrícolas.

No caso dos hidrofluorocarbonos, a ONU Meio Ambiente recomenda a substituição desses compostos por alternativas que não tenham impacto sobre as variações do clima. Os HFCs são usados principalmente nos sistemas de refrigeração e ar condicionado, bem como na confecção de espumas isolantes e mecanismos de disparo aerosol. Até 2020, o consumo dessas substâncias deverá dobrar. Uma vez no ambiente, elas permanecem de 15 a 29 anos na atmosfera.

“Muitos países já estão implementando medidas para eliminar as emissões procedentes dos setores de transporte e energia, mas sua aplicação não é uniforme na região”, avalia a chefe da Secretaria da Coalizão Clima e Ar Limpo, Helena Molin Valdés.

“Políticas públicas mais exigentes e um maior controle da contaminação podem impulsionar os incentivos econômicos e os benefícios para a ação climática, a saúde, a agricultura e o desenvolvimento sustentável. É essencial agir rapidamente.”
Carbono negro

O carbono negro é formado a partir da combustão incompleta de combustíveis fósseis ou biocombustíveis. A substância contribui para a produção de partículas finas, associadas a doenças pulmonares e cardiovasculares, derrames, infartos, patologias respiratórias crônicas, como bronquite, e agravamento da asma.

A América Latina e o Caribe são responsáveis por menos de 10% do total global de emissões de carbono negro geradas pelo homem, excluindo da estimativa os incêndios florestais e em regiões de savana. O transporte e a queima residencial de combustíveis sólidos para o preparo de alimentos e aquecimento residencial são a causa de 75% das emissões na região. Mais de 60% delas vêm do Brasil e do México.



Para o diretor da ONU Meio Ambiente para a América Latina e o Caribe, Leo Heileman, nações devem se inspirar nas soluções apresentadas pelo levantamento.

“Se os países da região as adotarem, contribuirão para manter o aumento da temperatura do planeta abaixo do limiar de 2ºC estabelecido no Acordo Climático de Paris”, afirmou o representante do organismo internacional.

O relatório Avaliação Integrada dos Poluentes Climáticos de Vida Curta é o primeiro do tipo elaborado pela agência das Nações Unidas e reúne trabalhos de 90 autores, coordenados por um grupo de especialistas. A publicação foi lançada pela ONU em parceria com a Coalizão Clima e Ar Limpo.

Acesse o documento na íntegra clicando aqui.


Da ONU Brasil, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 25/04/2018



Autor: ONU Brasil
Fonte: EcoDebate
Sítio Online da Publicação: EcoDebate
Data de Publicação: 25/04/2018
Publicação Original: https://www.ecodebate.com.br/2018/04/25/poluentes-de-vida-curta-ameacam-clima-saude-e-producao-agricola-na-america-latina-diz-relatorio-da-onu-meio-ambiente/

Redução do excesso de peso e da obesidade pode evitar 15 mil casos de câncer por ano no Brasil

Estudo da USP indica relação com consumo de alimentos ultraprocessados

Estima-se que pelo menos 15 mil casos de câncer por ano no Brasil, ou 3,8% do total, poderiam ser evitados com a redução do excesso de peso e da obesidade. E esse número deve ainda crescer até 2025, quando se estima que mais de 29 mil novos casos de câncer atribuíveis à obesidade e sobrepeso devam surgir por ano, índice que vai representar 4,6% de todos os novos casos da doença no país.

Os dados são de um estudo epidemiológico feito no Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), em colaboração com a Universidade de Harvard (Estados Unidos).

“O problema principal é que vem ocorrendo um aumento nas prevalências de excesso de peso e obesidade no Brasil e, com isso, os casos de câncer atribuíveis a essas duas condições também devem crescer. Fora isso, espera-se que haja um aumento nos casos de câncer como um todo, pois a população do país vai aumentar e envelhecer”, acredita o doutorando na FMUSP, Leandro Rezende.



De acordo com o estudo, o crescimento do sobrepeso e da obesidade na população está elevando o número de casos de câncer (Wilson Dias/Agência Brasil)


Rezende é um dos autores do artigo publicado na revista Cancer Epidemiology, com o título The increasing burden of cancer attributable to high body mass index in Brazil. O trabalho é resultado de uma Bolsa de Pesquisa no Exterior da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) realizada na Harvard University. Segundo o pesquisador, o aumento do poder econômico nos últimos anos levou a um maior consumo, porém, no caso da alimentação, o fenômeno ficou atrelado principalmente aos alimentos ultraprocessados.

“O estudo mostra essa fase de transição nutricional epidemiológica. São justamente esses alimentos altamente calóricos, com quantidade elevada de açúcar, sal e gordura, que também são os produtos mais baratos”, disse.

Obesidade e sobrepeso estão associados ao aumento de risco de 14 tipos de câncer, como o câncer de mama (pós-menopausa), cólon, reto, útero, vesícula biliar, rim, fígado, mieloma múltiplo, esôfago, ovário, pâncreas, próstata, estômago e tireoide, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). No Brasil, a incidência desses 14 tipos de câncer corresponde à metade do total de casos da doença diagnosticados por ano.

O estudo feito por Rezende, em colaboração com pesquisadores brasileiros e norte-americanos, calculou a fração atribuível populacional (FAP) do câncer relacionado ao índice de massa corporal (IMC) elevado. A FAP é uma métrica para estimar a proporção da doença possível de prevenir na população caso o fator de risco (nesse caso o sobrepeso e a obesidade) fosse eliminado, mantendo os demais fatores/causas estáveis.
População feminina

De acordo com o estudo, 3,8% dos mais de 400 mil casos de câncer diagnosticados anualmente são atribuíveis ao IMC elevado. Verificou-se também que esses casos são mais comuns em mulheres (5,2%) do que em homens. Isso se dá não apenas pelo fato de a média do IMC ser mais elevada nas mulheres, mas, principalmente, porque três tipos de câncer atribuíveis à obesidade e sobrepeso – ovário, útero e câncer de mama – afetam quase exclusivamente a população feminina.

Para estimar o excesso de peso e a obesidade na população brasileira, os pesquisadores usaram dados sobre IMC no Brasil em 2002 e 2013 da Pesquisa de Orçamentos Familiares e da Pesquisa Nacional de Saúde, ambas conduzidas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A análise de dados em dois momentos, e com dez anos de diferença, se justifica para analisar a latência da doença a partir do excesso de peso ou obesidade.

De acordo com os dados do IBGE, 40% da população brasileira tinha sobrepeso ou obesidade em 2002. Em 2013, o total subiu para aproximadamente 60%. Levando em conta IMC, magnitude do risco relativo, casos da doença e período de latência, os pesquisadores estimaram que, em 2012, cerca de 10 mil casos de câncer em mulheres e 5 mil casos em homens eram atribuíveis ao excesso de peso e obesidade aferidos dez anos antes. Já os dados sobre a incidência de câncer foram obtidos do Instituto Nacional de Câncer (Inca) e da base Globocan da Agência Internacional de Pesquisa em Câncer, da OMS.

De modo a quantificar a dimensão da contribuição do sobrepeso e da obesidade na incidência de câncer no Brasil, os autores do estudo estimaram FAPs da doença em 2012 (com dados existentes) e em 2025 (por meio de projeção) atribuídas a IMC elevado. As frações foram calculadas de acordo com sexo, idade, área geográfica e tipo de câncer.
Abordagem regional

O trabalho é um dos primeiros a fazer comparações regionais sobre a relação entre obesidade e câncer. De acordo com o estudo, as maiores FAPs, para todos os tipos de câncer, foram encontradas nos estados das regiões Sul (3,4% de mulheres para 1,5% de homens) e Sudeste (3,3% de mulheres para 1,5% de homens).



Os pesquisadores associam o aumento do sobrepeso na população ao consumo crescente de alimentos ultraprocessados (Arquivo/EBC)


Nas mulheres, as maiores FAPs foram encontradas nos estados de Rio Grande do Sul (3,8%), Rio de Janeiro e São Paulo (ambos 3,4%). Nos homens, as FAPs mais altas foram em Mato Grosso do Sul e São Paulo (ambos 1,7%).

“Houve aumento do IMC no país inteiro. Observamos que o impacto da obesidade é maior nas regiões Sul e Sudeste, principalmente em São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, mais ricos e com maiores IMC. No entanto, não se justifica uma estratégia de prevenção de câncer e redução da obesidade exclusivamente nessas duas regiões”, disse Rezende.

Isso porque, de acordo com o artigo, ao comparar os dados de IMC de 2013 e de 2002, os autores perceberam que as regiões Norte e Nordeste tiveram o maior aumento de IMC em comparação com outras regiões. “Os dados mostram que é preciso tomar precauções em outros locais, além do Sul e Sudeste”, alerta Rezende.
Políticas públicas

Na avaliação do professor titular da FMUSP e orientador do estudo, José Eluf Neto, o interessante é poder mensurar o impacto da relação de câncer e obesidade para a saúde pública e, com base nisso, planejar ações e investimentos.

“Hoje, se sabe que há uma razão biológica para haver essa relação, com mecanismos moleculares ou metabólicos bem descritos. É o caso da insulina. A obesidade causa resistência à insulina gerando inflamações e o aumento da proliferação celular”, esclarece Eluf Neto.
Alimentos ultraprocessados

De acordo com o artigo, as vendas de produtos ultraprocessados cresceram 103% em toda a América Latina entre os anos de 2000 e 2013, acompanhadas de um consequente aumento no IMC nos países da região. Para os autores, reverter esse quadro exige políticas públicas como a regulamentação de imposto, rotulagem nutricional e restrição de marketing de alimentos ultraprocessados.

“Esse crescimento de vendas na América Latina retrata uma estratégia da indústria de alimentos, assim como foi, ou tem sido, a da indústria de tabaco. Quando alguns países começam a regular minimamente a venda e publicidade desses alimentos, eles partem para regiões em que as leis ainda não foram estruturadas para promover a saúde da população”, analisa Rezende.

Segundo ele, o crescimento dos alimentos ultraprocessados no Brasil é comparável ao que ocorreu com a indústria de tabaco nos anos 1980. “O tabagismo, hoje, é um problema maior em países de baixa e média renda porque é onde a indústria de tabaco está focada. Fazer isso no Brasil em 2018 ficou mais complicado. Temos restrição de publicidade, é proibido fumar em ambiente fechado. Já no caso dos alimentos ultraprocessados, é como se estivéssemos em 1980. Os produtos não são comercializados, rotulados e taxados de maneira adequada a garantir a saúde da população”, disse.
Outros fatores

A equipe de pesquisadores está calculando também o peso de outros fatores, como sedentarismo, tabagismo, alimentação e consumo de álcool, na incidência e mortalidade por câncer. Os dados desses outros fatores ainda não foram publicados, mas o objetivo final do trabalho é compará-los e estimar quantos casos de câncer seriam evitáveis no Brasil.

“Existem fatores genéticos que aumentam o risco do desenvolvimento do câncer, mas isso não é algo modificável e também eles não excluem os outros fatores que causam a doença. O tabagismo é o principal fator de risco ou causa de câncer no Brasil, podemos adiantar essa análise, mas ele está caindo de forma importante, com prevalência em cerca de 15% da população. Com isso, outros fatores começam a ganhar relevância na formação de políticas públicas. Os dados mostram que não dá para cessar os esforços para reduzir o tabagismo, mas combater o sobrepeso e a obesidade também deve ser prioridade”, avalia o pesquisador.


Por Ludmilla Souza, da Agência Brasil, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 25/04/2018



Autor: Ludmilla Souza
Fonte: EcoDebate
Sítio Online da Publicação: EcoDebate
Data de Publicação: 25/04/2018
Publicação Original: https://www.ecodebate.com.br/2018/04/25/reducao-do-excesso-de-peso-e-da-obesidade-pode-evitar-15-mil-casos-de-cancer-por-ano-no-brasil/

Retirada do símbolo de identificação transgênico: da temeridade ambiental à afronta aos direitos constitucionais




Imagem: Senado


Retirada do símbolo de identificação transgênico: da temeridade ambiental à afronta aos direitos constitucionais. Entrevista especial com Leonardo Melgarejo

IHU

A decisão da Comissão de Meio Ambiente do Senado, de aprovar a retirada do símbolo de identificação de transgênico em rótulos de produtos alimentícios, atende aos interesses do mercado e é “uma temeridade sob o ponto de vista ambiental” e “um crime contra direitos constitucionais, uma afronta à legislação, no que tange a direitos dos consumidores”, diz o engenheiro agrônomo Leonardo Melgarejo à IHU On-Line. Para ele, a argumentação da Comissão de Meio Ambiente do Senado se baseia em uma “mitologia criada pelas indústrias beneficiadas pela ocultação de danos e riscos associados aos transgênicos. Afirmam que ‘inexistem evidências de danos’, quando há farta bibliografia apontando problemas. Afirmam que há farta bibliografia apontando inexistência de riscos, quando a maior parte destes estudos são elaborados, patrocinados ou associados às empresas beneficiadas. Afirmam que tais estudos são robustos, quando existem evidências de fragilidade no prazo de análise, no tamanho e na representatividade das amostras”.

Segundo ele, se a medida for aprovada definitivamente, “facilitará alocação de recursos públicos para as lavouras transgênicas, bem como a rolagem e o perdão de dívidas do agronegócio a elas associado”. A decisão, frisa, também “beneficiará o mercado de agrotóxicos, especialmente de herbicidas, com as implicações conhecidas”. Na entrevista a seguir, concedida por e-mail, Melgarejo diz que a tendência de aprovação da medida “é enorme” e “a única possibilidade de reversão neste processo de degradação das normas e contratos sociais reside na reação da população, o que depende de acesso a informações que não circulam na grande mídia”.



Melgarejo | Foto: João Vitor Santos – IHU

Leonardo Melgarejo é engenheiro agrônomo e doutor em Engenharia de Produção. É vice-presidente regional Sul da Associação Brasileira de Agroecologia.

Confira a entrevista.

IHU On-Line – Como avalia a decisão da Comissão de Meio Ambiente do Senado, de aprovar a retirada da identificação de transgênicos em rótulos de produtos alimentícios?

Leonardo Melgarejo – Uma temeridade sob o ponto de vista ambiental, já que estimulará o consumo e, portanto, o cultivo de lavouras transgênicas, potencializadoras do uso de agrotóxicos a elas associados. Um crime contra direitos constitucionais, uma afronta à legislação, no que tange a direitos dos consumidores. Encaminhamento de retrocesso desta natureza, com origem na comissão de meio ambiente só pode ser entendido como sinal de contaminação das decisões daquela comissão, em benefício de interesses contrários a seus compromissos com a precaução e a proteção ambiental.

IHU On-Line – O que está em jogo na disputa de manter ou não o símbolo de transgênico nos rótulos dos alimentos?

Leonardo Melgarejo – Interesses de mercado e expansão do domínio da mídia corporativa sobre a consciência coletiva. De um lado, os consumidores não poderão optar pela rejeição aos produtos transgênicos, significando que não poderão sinalizar ao governo, quanto a suas preferências por políticas públicas para a agricultura. Isto facilitará alocação de recursos públicos para as lavouras transgênicas, bem como a rolagem e o perdão de dívidas do agronegócio a elas associado. Da mesma forma, beneficiará o mercado de agrotóxicos, especialmente de herbicidas, com as implicações conhecidas.

Pulverizações aéreas, contaminação de lavouras vizinhas, de aquíferos, de áreas de proteção, passeio e lazer, com ampliação de danos à saúde da população e aos serviços ambientais, serão alguns dos aspectos negativos. Com o agravante de que não será possível estabelecer nexo causal entre aquelas lavouras e os danos para a saúde da população, desresponsabilizando as empresas e seus agentes, quanto aos problemas futuros.

IHU On-Line – Por que razões tem se proposto a retirada da identificação de transgênicos dos rótulos de produtos alimentícios e quais foram os argumentos apresentados pela Comissão para justificar a retirada do símbolo de identificação dos rótulos de alimentos?


Afirmam que “inexistem evidências de danos”, quando há farta bibliografia apontando problemas

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Leonardo Melgarejo – Os proponentes se baseiam em mitologia criada pelas indústrias beneficiadas pela ocultação de danos e riscos associados aos transgênicos. Afirmam que “inexistem evidências de danos”, quando há farta bibliografia apontando problemas. Afirmam que há farta bibliografia apontando inexistência de riscos, quando a maior parte destes estudos são elaborados, patrocinados ou associados às empresas beneficiadas. Afirmam que tais estudos são robustos, quando existem evidências de fragilidade no prazo de análise, no tamanho e na representatividade das amostras. Afirmam que são cultivados em todo o planeta, quando na verdade as lavouras se concentram nos EUA, Brasil, Argentina e Canadá.


Com agroecologia e reforma agrária, a sociedade pode fazer mais e melhor, em termos de produção de alimentos, geração de empregos e proteção à saúde e ao ambiente

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A mitologia que sustenta a decisão da Comissão se escora numa prática simples, que combina a ocultação de informações contrárias, a desqualificação de estudos contrários e justificação enganosa (como a de que não seria possível alimentar o mundo sem os transgênicos, ou de que eles estariam contribuindo para redução no uso de agrotóxicos, proteção ambiental e dos consumidores/trabalhadores), com apoio da grande mídia e formadores de opinião seletivamente recrutados a opinar.

Com agroecologia e reforma agrária, a sociedade pode fazer mais e melhor, em termos de produção de alimentos, geração de empregos e proteção à saúde e ao ambiente. É impressionante o fato de a Comissão de Meio Ambiente não apenas fechar os olhos a isto como ainda propor avanços, na contramão, em rumo oposto.

IHU On-Line – Na sua avaliação, o símbolo de identificação de transgênico deve ou não permanecer nos rótulos de alimentos? Por quê?

Leonardo Melgarejo – Deve permanecer. Pelos motivos já referidos. Trata-se de direito constitucional e de necessidade comum a toda dona de casa que frequenta mercados, onde compra itens para alimentar sua família. O direito de acesso a informações para tomada de decisões responsáveis, no momento da opção pela aquisição de alimentos, não pode ser destruído por vontade de grupo golpista, em fim de mandato e claramente desinteressado em preservar direitos fundamentais da população.

A ocultação desta informação, a retirada do “T”, implicará em retrocesso inaceitável, que servirá aos interesses comerciais em desprezo aos direitos republicanos, e que deve ser denunciada: estamos perto de engolir mais uma afronta ao contrato social que nos mantém como sociedade organizada.

IHU On-Line – O que as pesquisas que têm sido feitas demonstram sobre a segurança dos transgênicos para a saúde?


Estudo recente, avaliando mais de mil artigos, apontava que em 70% dos casos avaliados havia indícios de conflitos de interesse, levando a resultados sistematicamente favoráveis aos desejos corporativos

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Leonardo Melgarejo – As pesquisas patrocinadas pelas empresas e interesses associados têm se relevado comprometidas. A bibliografia internacional mostra isso. Estudo recente, avaliando mais de mil artigos, apontava que em 70% dos casos avaliados havia indícios de conflitos de interesse, levando a resultados sistematicamente favoráveis aos desejos corporativos. Além disso, os dados básicos destas pesquisas, onde os interesses empresariais afetam resultados, costumam ser ocultados, de forma a impedir sua revisão crítica.

De outro lado, em estudos independentes, via de regra negligenciados pelas agências avaliadoras de risco, os resultados são opostos. Na maioria destes casos são apontados indícios de problemas, falhas de metodologia, ocultação ou subvalorização de achados indicativos de problemas, entre outros elementos contrários ao que se divulga nas campanhas de marketing.

Como regra, deve-se afirmar que faltam pesquisas e falta transparência para as pesquisas disponíveis. As agências reguladoras carecem de recursos, de mecanismos e talvez inclusive de interesse em qualificar suas atividades para melhor defender a saúde humana e ambiental. Como agravante, temos o fato de que a sociedade vem sendo enganada por campanhas de marketing e manipulação de informações, o que em conjunto acaba levando à apatia e à formação de uma consciência coletiva ingênua e equivocada, sobre os riscos inerentes ao que ocorre neste campo.

IHU On-Line – Qual é a probabilidade de que a decisão da Comissão seja aprovada definitivamente? Como essa questão possivelmente será vista pela Comissão de Transparência, Governança, Fiscalização e Controle e Defesa do Consumidor?


A retirada do “T”, implicará em retrocesso inaceitável, que servirá aos interesses comerciais em desprezo aos direitos republicanos, e que deve ser denunciada

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Leonardo Melgarejo – A tendência de aprovação é enorme. A única possibilidade de reversão neste processo de degradação das normas e contratos sociais reside na reação da população, o que depende de acesso a informações que não circulam na grande mídia. Iniciativas como esta, do IHU, contribuem de forma expressiva, mas são insuficientes para dar conta do problema. Precisamos de uma Voz do Brasil, umacadeia de mídia verdadeira preocupada e comprometida com os interesses nacionais.

IHU On-Line – Como o senhor avalia o Projeto de Lei do deputado Luis Carlos Heinze (PP-RS), PLC 34/2015, sobre o uso do símbolo dos transgênicos, que será votado na Comissão de Agricultura e Reforma Agrária do Senado possivelmente na próxima semana?

Leonardo Melgarejo – Todos os comentários acima sustentam a necessidade de uma posição de rejeição a esta proposta. Ela implica em ofensa a direitos constitucionais. Ela trará/agravará ameaças à saúde humana e ambiental. Ela simplesmente não atende aos interesses nacionais.

Espero, sinceramente, que deputados como este sejam percebidos e interpretados com clareza, em função das implicações de seus esforços e iniciativas, tanto pela sociedade, no presente, como por seus filhos e netos, no futuro.


(EcoDebate, 25/04/2018) publicado pela IHU On-line, parceira editorial da revista eletrônica EcoDebate na socialização da informação.


Autor: EcoDebate
Fonte: EcoDebate
Sítio Online da Publicação: EcoDebate
Data de Publicação: 25/04/2018
Publicação Original: https://www.ecodebate.com.br/2018/04/25/retirada-do-simbolo-de-identificacao-transgenico-da-temeridade-ambiental-a-afronta-aos-direitos-constitucionais/

terça-feira, 24 de abril de 2018

Como o estímulo de áreas do cérebro pode silenciar compulsão por comida



Cientistas estão tentando transformar a forma como o cérebro responde a comida (Foto: Sbtlneet /Pixabay/CC0 Creative Commons)


Anna viveu deprimida durante boa parte de sua vida adulta, sempre buscando tratamentos que pudessem ajudá-la. Ela tomou antidepressivos, frequentou psicoterapia e até tentou terapia eletroconvulsiva - o uso da eletricidade pelo cérebro.


Tratamentos como esses só eram eficazes por períodos curtos de tempo e sua depressão logo voltava. Outro problema que ela enfrentava era sua obesidade mórbida: pesava 183 kg e chegou a ter índice de massa corporal (IMC) de 63. Isso limitava muito sua mobilidade, o que, naturalmente, intensificava ainda mais sua depressão, em um ciclo vicioso de prejuízos à saúde.


A cirurgia bariátrica a ajudou a perder peso, mas não tanto quanto ela esperava e teve pouco impacto na saúde mental. Como última alternativa, psiquiatras tomaram a decisão drástica de implantar um dispositivo elétrico em seu cérebro, uma terapia invasiva conhecida como estimulação cerebral profunda. É um tratamento que já é frequentemente usado para diminuir os sintomas da doença de Parkinson e da epilepsia.


O método não apenas ajudou a conter a depressão significativamente como teve outro impressionante resultado: ela perdeu quase 50% a mais de peso por mês (2,8 kg) do que ela havia perdido logo após a cirurgia bariátrica. Thomas Munte, neurologista da Universidade de Lubeck, na Alemanha, responsável pelo caso, diz que o objetivo inicial era tratar a depressão e que a perda de peso seria o "objetivo número dois" da cirurgia. No seu caso, ambos pareciam interligados.


O caso de Anna está abrindo caminho para novas discussões sobre uma epidemia global. Também é revelador que, em alguns raros casos, o cérebro possa ser "dessintonizado" de comportamentos prejudiciais, como vício.


A estimulação cerebral profunda ainda é controversa, mas não é um tratamento novo. Ela data de 1930, quando neurocirurgiões não eram tão cuidadosos quanto hoje. Foi o neurocirurgião Wilder Penfield o primeiro a desenvolver uma técnica ousada para tratar a epilepsia. Ele estimulava diferentes partes do cérebro com uma sonda elétricas, mantendo os pacientes acordados durante o processo para que pudessem entender o efeito dela. A ideia era que a área do cérebro causando o problema pudesse ser identificada e destruída.



Na verdade, cientistas basicamente "cozinhavam pedaços do cérebro", diz Munte, para criar pequenas lesões. Isso era feito para tratar pacientes com distúrbios de movimentos como a distonia, que causa tremores ou espasmos repetitivos. Esse procedimento era chamado de "cirurgia estereotáxica" e essa época foi chamada de "um momento único de experimentações humanas empíricas".


Mais ou menos na mesma época, um neurologista chamado Antonio Egas Moniz estava ocupado retirando pequenas partes do lobo frontal do cérebro de seus pacientes - uma área vital para o planejamento e a personalidade. O tratamento foi considerado bem-sucedido em vários casos - e as inevitáveis consequências e mudanças de personalidade foram vistas como efeitos secundários. Para a surpresa de todos, esse trabalho lhe rendeu um Prêmio Nobel em 1949.


Retirar partes do cérebro e observar os resultados lhe foi útil para o estudo e a prática da estimulação cerebral - que permitiu que neurologistas compreendessem que áreas do cérebro podem ser beneficiadas com os eletrodos.


Quando remédios antipsicóticos e antidepressivos se tornaram mais comuns nas receitas médicas, a predominância dessas técnicas invasivas e irreversíveis foi reduzida, mas as lições aprendidas nas áreas cerebrais envolvidas foram imporantes para a estimulação cerebral como a conhecemos hoje.


Em 2002, a estimulação cerebral profunda foi aprovada para o tratamento do mal de Parkinson e já foi aplicada em mais de 40 mil pacientes. Apesar de ser usada majoritariamente para tremores, abriu-se caminho para que ela fosse utilizada em outros distúrbios, como depressão severa - caso de pacientes como Anna.


Para realizar a estimulação cerebral profunda, os cientistas precisam de uma espécie de furadeira para abrir um buraco no crânio do paciente. Depois disso, eles colocam eletrodos no próprio cérebro. Em muitas vezes, o paciente está acordado, o que permite que os pesquisadores testem a área do cérebro enquanto este é estimulado.



No caso de Anna, a área alvo da estimulação era o núcleo accumbens, que faz parte da região de recompensa do cérebro que é muito importante para processar o prazer. A área está ligada à depressão - já que pessoas depressivas demonstram um interesse reduzido no prazer. "É possível observar uma resposta emocional de um paciente ao estimular (essa área)", explica Munte sobre sua paciente, que prefere se manter anônima. Sua análise sobre o caso foi publicada no jornal científico Neurocase.




Tratando a obesidade




Algumas pessoas podem sofrer de obesidade por causa de uma alteração no sistema de recompensa no cérebro, diz Munte. Há obesos que demonstram até diferentes padrões cerebrais em relação a pessoas magras quando expostos a fotos de comidas gostosas. A teoria é a de que o núcleo accumbens é a área que leva pessoas viciadas ao seu objeto de desejo - seja comida, álcool ou drogas.


Geralmente, a área do cérebro que nos ajuda a agir racionalmente evita que a parte impulsiva, faminta e imediatista em relação a recompensas nos domine. Mas o sistema de recompensas pode às vezes "se sobrepor a nossos bons modos", diz o neurocirurgião Piotr Zielinski, da Universidade de Educação Física e Esportes em Gdansk, na Polônia. A indústria das dietas prospera graças aos nossos núcleos accumbens, diz ele.


O poder viciante do sistema de recompensas do nosso cérebro foi demonstrado em um famoso estudo de 1950 com ratos, que apresentaram inclinação maior a estimular essa região do cérebro do que a beber ou comer. Se essa área do cérebro fosse "perturbada" ou talvez até inibida por estimulações elétricas, então o "ímã motivacional deixa de estar lá e você não é mais atraído a esse objeto", diz Munte.


O uso da estimulação cerebral para impedir uma área do cérebro a realizar sua função ainda é uma teoria não comprovada, mas reforçada pela pesquisa em animais. Como o impacto desse tipo de tratamento ainda não é plenamente conhecido, ele continua controverso. "Às vezes, na medicina, você começa a fazer (tratamentos clínicos) antes de sequer saber exatamente como funciona", diz Munte. No caso do mal de Parkinson, a estimulação cerebral profunda provou ter um impacto positivo muito maior na qualidade de vida do que outros tratamentos.



Em breve, talvez poderemos ver impactos positivos no tratamento da depressão e até obesidade, agora que emergem casos mais promissores, como o de Anna. Por exemplo, Zielinski viu a prática expandir do tratamento para mal de Parkinson - seu departamento realizou mais de 2,5 mil procedimentos do tipo desde os anos 1990 - para o tratamento de agressões patológicas, síndrome de Tourette e transtorno obsessivo compulsivo.


Ele também tratou três pessoas com obesidade com estimulação cerebral durante o sono, todas como última alternativa quando nenhuma outra técnica se mostrava eficaz a longo prazo. Assim como no caso de Anna, a obesidade foi tratada como uma desordem compulsiva. A obesidade de uma paciente foi atribuída a um tumor que ela teve durante a infância que prejudicou uma área importante do seu cérebro para a regulação de fome e saciedade.


Os pensamentos dessa paciente eram completamente ligados a comida. "Então presumimos que uma cirurgia bariátrica não seria uma solução", explica Zielinski. Apesar de sua perda de peso não ter sido tão grande, o impacto em sua vida foi transformador. A estimulação cerebral lhe trouxe independência. Agora ela pode estudar e "pensar em qualquer outra coisa além de comida", diz ele. "Ela parou de roubar comida da geladeira lacrada dos seus pais".




Cérebro viciado




Ainda assim, Munte ressalta que a estimulação cerebral não deve ser encarada como um tratamento generalizado para a obesidade, especialmente porque deve continuar sendo visto como um último recurso. Pode ser uma técnica cara e invasiva, então obviamente não é adequada para a maioria das pessoas com obesidade.


Ela é mais apropriada para o grupo de pacientes obesos com tendências aditivas (vício) em relação à comida. Sonja Yokum, neurocientista que estuda obesidade no Instituto de Pesquisa de Oregon, tem estudado exatamente isso. Ela demonstrou que a comida pode desencadear um processo viciante no cérebro que têm os mesmos sintomas neurais que outros vícios mais comuns, como em drogas ou álcool. Algumas pessoas estão mais em risco que outras, em parte pela forma como estão "programadas".



Por exemplo, Yokum revelou que adolescentes que tiveram áreas do cérebro mais atentas em relação à comida tinham um risco maior de acumular uma quantidade não saudável de peso.


"Uma possível explicação é que algumas pessoas têm uma respoosta mais elevada da região de recompensa (o que pode ter uma base biológica) e isso pode deixá-las mais vulneráveis a desejos por comida, o que resulta em um uma maior ingestão calórica e um aumento de peso", diz ela. Pode ser uma explicação para o motivo pelo qual programas de perda de peso raramente têm resultados muito duradouros.


Portanto, Anna era um caso ideal para testar a estimulação cerebral profunda, tanto por sua depressão quanto por suas tendências aditivas em relação a comida, diagnosticadas a partir de vários questionários. Ela representa um grupo de pessoas obesas que entram na categoria de transtorno aditivo em relação a comida. Tipicamente, elas acham muito difícil não aceitar comida quando lhes é oferecida, de uma maneira parecida como um alcóolatra talvez não consiga passar na frente de um bar sem entrar e beber.


Além disso, enquanto essas pessoas demonstram uma ativação cerebral maior em relação à comida do que indivíduos com um peso saudável, quando elas finalmente conseguem sua recompensa (comida), a ativação do cérebro diminui. Isso demonstra, diz Yokum, outro fator parecido com aquele encontrado no abuso de substâncias - o de que pessoas viciadas ficam empolgadas com a probabilidade de ter o que desejam, mas, assim que o conseguem, a ativação nessa área na verdade diminui. Isso pode significar, portanto, que "eles precisam comer muito mais para conseguir os mesmos níveis de empolgação que antes", diz ela.


Isso é obviamente problemático quando se trata de comida - algo indispensável à sobrevivência. Pessoas obesas que demonstram comportamentos aditivos em relação a comida podem achar muito difícil controlar o consumo do que desejam porque é impossível evitá-lo completamente.



É por isso que Yokum e sua equipe estão desenvolvendo tarefas com o objetivo de ajudar pessoas obesas a "reiniciar" a forma como o cérebro responde a comida. Eles fazem isso mostrando imagens digitais de comidas saudáveis a um paciente e depois pedir a eles para dar um "curtir" nelas e pedindo para fazer o oposto com comidas não saudáveis. "Estamos tentando treinar o cérebro dessa forma", diz a especialista.


Técnicas menos invasivas e mais baratas como essas podem ser vitais para tratar essa epidemia global - há 650 milhões de adultos e 340 milhões de crianças e adolescentes atualmente considerados obesos. A obesidade contribui para estimadas 2,8 milhões de mortes por ano no mundo todo.


Embora a estimulação cerebral possa não ser a resposta para a maioria, ela mostra como resultados positivos iniciais demonstram que, nos casos mais sérios, tratamentos experimentais podem salvar vidas.


Sem dúvidas não há uma estratégia que sirva a todos, e o complexo caso de Anna ressalta que há mais do que uma questão contribuindo para o hábito de comer demais. Se entendermos isso, uma estratégia focada como a estimulação cerebral pode ser um passo importante para ajudar algumas pessoas a se livrar do peso que elas querem - ou até precisam - desesperadamente perder.




Autor: Melissa Hogenboom
Fonte: BBC
Sítio Online da Publicação: G1 Globo
Data de Publicação: 22/04/2018
Publicação Original: https://g1.globo.com/ciencia-e-saude/noticia/como-o-estimulo-de-areas-do-cerebro-pode-silenciar-compulsao-por-comida.ghtml