O avanço do comércio exterior é essencial para o desenvolvimento econômico de qualquer nação e para se atingir alto padrão de vida populacional. Como mostrou Adam Smith, em 1776, a divisão do trabalho (que implica em geração de emprego e aumento da produtividade da economia) depende da extensão dos mercados nacionais e internacionais. Em função das vantagens comparativas do comércio global, uma maior inserção do país no comércio mundial é essencial para o desenvolvimento nacional e regional.
Com o avanço do desenvolvimento urbano-industrial e da modernização conservadora do campo, as exportações brasileiras passaram de US$ 1,4 bilhão em 1961 para US$ 207 bilhões em 2020, em termos nominais. Foi um crescimento expressivo no período de 60 anos, porém, pela primeira vez na história recente o Brasil teve uma década com redução das exportações.
A tabela abaixo, com dados da Organização Mundial do Comércio mostra que na década de 1960 as exportações brasileiras passaram de US$ 1,4 bilhão em 1961 para US$ 2,74 bilhões em 1970, um crescimento de 6,9% ao ano. A década de 1970 apresentou o melhor desempenho, com as exportações brasileiras passando de US$ 2,9 bilhões em 1971 para US$ 20,13 bilhões em 1980, um crescimento de 21,4% ao ano. Nas décadas de 1980 e 1990 o crescimento anual das exportações foram bem menores, respectivamente, de 3% aa e de 5,7% aa. Na primeira década do século XXI, as exportações, aproveitando o superciclo das commodities, voltaram a crescer e passaram de US$ 58,3 bilhões no ano 2001 para US$ 201,9 bilhões em 2010, um crescimento anual de 13,2%, o segundo melhor da série.
Mas o Brasil regrediu no panorama global na década de 2011-20, pois as exportações caíram de US$ 256 bilhões em 2011 para US$ 207 bilhões em 2020. Com o processo de desindustrialização do Brasil e a redução do preço internacional das commodities, o valor das exportações nacionais caíram, o que contribuiu para o Brasil ter a pior década em termos de renda per capita em mais de um século.
O quadro do comércio internacional mostra que o Brasil possui uma inserção subordinada na ordem internacional e possui uma economia com muita fragilidade, pois além de perder espaço quantitativo no comércio global, tem piorado a qualidade das exportações ao reduzir o volume de envio de bens manufaturados e aumentado o volume de bens básicos e commodities, o que a espiral de reprimarização e de especialização regressiva do maior país da América Latina.
Por exemplo, em 1984 o Brasil exportou US$ 27 bilhões, representando 1,4% das exportações globais, enquanto a China exportou US$ 26,1 bilhões, representando 1,3% das exportações globais. Mas enquanto o Brasil exportou US$ 224 bilhões em 2019, representando pouco mais de 1% do comércio global, a China exportou quase US$ 2,5 trilhões, representado cerca de 13% do comércio global e algo como 11 vezes mais do que as exportações brasileiras. Claro que a China é um país enorme e que briga pela hegemonia global com os Estados Unidos. Mas o Brasil perde mesmo para países muito menores em termos de população e território.
O gráfico abaixo, também com dados da Organização Mundial de Comércio (WTO, na sigla em inglês), mostra que o avanço do Vietnã na área de exportação e de competitividade internacional em relação ao Brasil é, indubitavelmente, impressionante, Em 1984, o Brasil exportou US$ 27 bilhões, contra apenas US$ 649 milhões do Vietnã (41,6 vezes mais). Em 2011, quando o Brasil bateu o recorde de exportação de US$ 256 bilhões, o Vietnã exportou US$ 96,9 bilhões (o Brasil exportou 2,6 vezes mais). Mas entre 2016 e 2018 os dois países exportaram, aproximadamente, o mesmo valor. Contudo, em 2019, enquanto as exportações brasileiras caiam, as exportações vietnamitas cresciam e atingiram US$ 262 bilhões. Em 2020, mesmo com todos os problemas gerados pela pandemia da covid-19, as exportações do Vietnã continuaram crescendo e atingiram US$ 280 bilhões, enquanto as exportações do Brasil caíram de US$ 224 bilhões em 2019 para US$ 207 bilhões em 2020.
Analisando a situação do comércio exterior do Brasil e do Vietnã com os Estados Unidos, o gráfico abaixo, com dados do Census Bureau, mostra que o Vietnã tinha um saldo comercial positivo com os EUA de cerca de US$ 0,5 bilhão no começo dos anos 2000, passou para US$ 11,2 bilhões em 2010 e chegou a US$ 68 bilhões em 2020. Enquanto isto, o Brasil que chegou a ter um saldo positivo de US$ 7 bilhões em 2003 com os EUA, passou para um déficit de US$ 17 bilhões em 2013 e manteve um saldo negativo com US$ 12 bilhões em 2020.
O fato é que o Brasil, entre 1900 e 1980, crescia muito, enquanto o Vietnã – que estava dominado pela França e em guerra contra o Japão e os Estados Unidos – se mantinha um país pobre e atrasado. Mas os papéis se inverteram nos últimos 30 a 40 anos. O Brasil teve uma década perdida no período 1981-1990, quando o crescimento do PIB ficou abaixo do crescimento da população, apresentou baixo crescimento econômico entre 1991 e 2010 e teve uma nova década perdida na atualidade (2011-2020). Enquanto isto, do outro lado do mundo, o Vietnã manteve um crescimento do PIB acima de 6% ao ano desde meados da década de 1980. Mantida a tendência das últimas décadas a renda per capita do Vietnã será maior do que a renda per capita brasileira no início da década de 2030.
O Vietnã tem uma estratégia de desenvolvimento socioeconômico, tem se beneficiado da sua localização no leste asiático – que é a região de maior crescimento do mundo – e tem sabido se manter em equilíbrio com as duas potências mundiais. Em fevereiro de 2019 o país sediou a reunião entre o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e o líder da Coreia do Norte, Kim Jong-un, ocorrida em Hanói. Na guerra comercial entre China e EUA o Vietnã tem sido um vencedor. Agora em 2020 entrou no grande acordo regional denominado Parceria Econômica Regional Abrangente (RCEP, na sigla em inglês), que será maior que a União Europeia e o Acordo Estados Unidos-México-Canadá. Os membros somam quase um terço da população mundial e 29% do Produto Interno Bruto (PIB) do planeta. Em relação à pandemia, o Vietnã com 100 milhões de habitantes apresentou somente 1490 casos e 35 mortes durante todo o ano de 2020. Apesar de ter um governo autoritário e pouco transparente, o Vietnã tem seguido o rumo da vitória na luta contra o subdesenvolvimento e o isolamento político.
Já o Brasil está com uma economia estagnada e possui uma renda per capita menor do que a de 2010 e só deve recuperar o mesmo nível do pico pré-recessão em 2025. Para fechar o Balanço de Pagamentos e cobrir os rombos na conta transações correntes o país precisa vender seu patrimônio para firmas estrangeiras e se endividar em dólares, processo que é insustentável no longo prazo. O Brasil vive uma grande crise fiscal, possui baixos níveis de investimento e tem mais de 30 milhões de pessoas desempregadas ou subutilizadas. O déficit em transação corrente do Brasil mostra que o país tem uma economia submergente, pouco competitiva, que perde espaço no cenário global e que terá grandes dificuldades para resolver seus problemas sociais e ambientais.
Os anos de 2021 e 2022 não prometem muita coisa positiva. O Brasil vai passar pelos 200 anos da Independência em uma situação dramática, podendo enfrentar o começo de uma terceira década perdida.
Há 80 anos, em 1941, o escritor austríaco Stefan Zweig publicou o livro “Brasil, País do Futuro”. O que se percebe hoje em dia é que o futuro está cada vez mais distante.
José Eustáquio Diniz Alves
Colunista do EcoDebate.
Doutor em demografia, link do CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/2003298427606382
Referência:
ALVES, JED. Bônus demográfico no Brasil: do nascimento tardio à morte precoce pela Covid-19, R. bras. Est. Pop., v.37, 1-18, e0120, 2020
https://www.scielo.br/pdf/rbepop/v37/0102-3098-rbepop-37-e0120.pdf
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 14/01/2021
Autor: José Eustáquio Diniz Alves
Fonte: EcoDebate
Sítio Online da Publicação: EcoDebate
Data: 14/01/21
Publicação Original: https://www.ecodebate.com.br/2021/01/14/a-pior-decada-para-as-exportacoes-brasileiras/
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