sábado, 6 de julho de 2024

Presença de bactéria no solo torna flores mais atrativas para polinizadores, aponta estudo



Biodiversidade
Presença de bactéria no solo torna flores mais atrativas para polinizadores, aponta estudo
Experimentos feitos na UFABC mostram que microrganismo essencial para a fixação de nitrogênio exerce papel fundamental na reprodução de leguminosa nativa do Brasil

05 de julho de 2024

Fêmeas de mamangava visitando uma flor de chamaecrista no campo. Inseto vibra as partes internas da flor para extrair os grãos de pólen ricos em proteínas, que são levados para suas larvas no ninho (foto: Anselmo Nogueira)

 

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André Julião | Agência FAPESP – Uma bactéria que vive no solo e é conhecida por fixar nitrogênio quando associada às raízes de algumas plantas influencia de forma decisiva a capacidade de reprodução de uma espécie nativa de leguminosa chamada chamaecrista (Chamaecrista latistipula). Isso porque a presença do microrganismo no solo aumenta a atratividade das flores para os polinizadores, como revela estudo publicado esta semana no American Journal of Botany.

Essa relação entre microrganismos, plantas e animais é conhecida como mutualismo. Os mutualismos são interações entre indivíduos de diferentes espécies em que todas as partes saem ganhando, obtendo nutrientes ou se reproduzindo com a ajuda um do outro.

É o que acontece com a chamaecrista, uma leguminosa nativa do Brasil que vive em solos naturalmente pobres em nutrientes e que depende de um tipo específico de polinizador para poder se reproduzir.

“Um dos mutualismos importantes nessa espécie de planta é com as bactérias fixadoras de nitrogênio na raiz, que aumentam a disponibilidade desse nutriente para as plantas em troca de açúcares, que servem como alimento para os microrganismos”, conta Anselmo Nogueira, professor do Centro de Ciências Naturais e Humanas da Universidade Federal do ABC (CCNH-UFABC), em São Bernardo do Campo.

“Há outro mutualismo entre essas plantas e um tipo específico de polinizador. O pólen da chamaecrista fica encapsulado numa parte das flores e só é liberado por vibração, quando a flor é chacoalhada principalmente por fêmeas de algumas espécies de mamangava do gênero Bombus”, completa.

Experimentos realizados no Laboratório de Interações Planta-Animal, coordenado por Nogueira, mostraram que a presença dessas bactérias principalmente em solos pobres em nutrientes é fundamental para que as flores sejam atrativas para as mamangavas.

“Observamos ainda um efeito drástico, que não esperávamos. Como a associação das plantas com as bactérias é muito custosa para a planta, supomos que, num solo rico em nitrogênio, as plantas simplesmente aproveitariam o nutriente diretamente do solo. Nos nossos experimentos, porém, solos ricos em nutrientes não produziram plantas saudáveis, com flores atrativas”, explica Caroline Souza, primeira autora do estudo apoiado por bolsa de treinamento técnico da FAPESP.

O trabalho integra o projeto “Efeitos sinérgicos de múltiplos mutualistas nas plantas: como bactérias, formigas e abelhas contribuem para a evolução de um grupo de leguminosas”, vinculado ao Programa BIOTA-FAPESP e coordenado por Nogueira.

Bactéria, planta e inseto

Para chegar aos resultados, os pesquisadores acompanharam o crescimento de 60 pés de chamaecrista, desde a germinação das sementes, por 16 meses. As plantas foram cultivadas em duas condições de solo. Metade em uma mistura composta de 90% de areia e 10% de terra vegetal, com uma baixa concentração de nutrientes, especialmente nitrogênio. A outra metade foi cultivada em solo rico em matéria orgânica e suplementado com nitrato de potássio, que libera nitrogênio no solo. A acidez dos dois solos foi monitorada por seis meses, para garantir que ambos estivessem neutros e não influenciassem a relação entre raízes e bactérias.

Antes das sementes serem plantadas, porém, foram esterilizadas com álcool, água sanitária e peróxido de hidrogênio, a fim de eliminar qualquer bactéria que pudesse influenciar os resultados. Logo depois, foram lavadas com água destilada. Com o mesmo objetivo, o solo passou por esterilização em uma autoclave, em que os microrganismos são eliminados por altas temperaturas.

Os dois tipos de solo foram então subdivididos em quatro tratamentos. Em metade dos potes com solo arenoso e pouco nitrogênio e em metade das plantas cultivadas em solo rico em matéria orgânica e nitrogênio foi acrescentada uma solução rica em rizóbio, um tipo de bactéria conhecido pela capacidade de fixar nitrogênio nas raízes. Os demais potes permaneceram sem as bactérias. Os microrganismos aplicados foram isolados diretamente de nódulos das raízes da mesma espécie de chamaecrista obtidas em populações naturais.

Nos solos arenosos e pobres em nitrogênio, em que as bactérias não foram adicionadas, as plantas cresceram muito pouco, com folhas sempre amareladas evidenciando carência de nitrogênio. As plantas que obtiveram melhor desenvolvimento foram as cultivadas em solo arenoso e com presença de rizóbio.


Autor: FAPESP 
Fonte: FAPESP 
Sítio Online da Publicação: FAPESP 
Data: 05/07/2024

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