quinta-feira, 24 de março de 2022

Investigação de dor torácica estável: angiotomografia ou cateterismo?

A angiografia coronariana invasiva ou coronariografia, realizada pelo cateterismo, é o exame padrão para diagnóstico de doença arterial coronária (DAC) obstrutiva e tem a grande vantagem de permitir a realização de revascularização coronária no mesmo procedimento. Porém, quando este exame é realizado para elucidação diagnóstica em pacientes com dor torácica estável, mostra doença obstrutiva em apenas 38 a 50% dos casos.

A angiotomografia (angioTC) de coronárias é uma alternativa não invasiva para pacientes que apresentam dor torácica estável e que tem probabilidade pré-teste intermediária de DAC obstrutiva. A ocorrência de eventos adversos no exame é bastante baixa e ele consegue identificar candidatos a revascularização. Estudos prévios já mostraram que a angioTC é equivalente ou até melhor que exames funcionais, com redução de desfechos e melhor seleção de quem se beneficia de exame invasivo.


Baseado nisso, foi feito um novo estudo, o DISCHARGE, com objetivo de comparar a angioTC e a coronariografia invasiva como estratégia diagnóstica inicial para guiar o tratamento de pacientes com dor torácica estável.

Método do estudo e população envolvida

Foi um ensaio clínico de superioridade, multicêntrico, pragmático e randomizado que incluiu pacientes com pelo menos 30 anos que tinham dor torácica estável e probabilidade pré teste de DAC intermediária (10 a 60%), que tiveram indicação de coronariografia pelos seus médicos. Os critérios de exclusão eram realização de diálise, ausência de ritmo sinusal e gravidez.

Os pacientes foram randomizados em uma razão 1:1 para angioTC ou coronariografia. Quando o exame não mostrava DAC obstrutiva, o paciente retornava com seu médico para reavaliação e quando havia DAC obstrutiva, o paciente era tratado de acordo com os guidelines vigentes.

O desfecho primário de eventos cardiovasculares maiores era composto de morte cardiovascular, infarto agudo do miocárdio (IAM) não fatal e acidente vascular cerebral (AVC) não fatal. Não houve coleta de biomarcadores para detecção de infarto silencioso ou realização de imagem de rotina para detecção de AVC assintomático. Desfechos secundários foram as complicações maiores que ocorreram durante o procedimento ou nas primeiras 48 horas após o exame ou procedimento de revascularização.

Resultados

Os 3.667 pacientes foram incluídos de 2015 a 2019, sendo 1833 randomizados para angioTC e 1834 para coronariografia. Do total de pacientes, 56,2% eram mulheres, a idade média foi de 60,1 anos e um terço dos pacientes realizou exame funcional antes da randomização. A ocorrência de hipertensão, diabetes e dislipidemia foi semelhante entre os grupos. O diagnóstico de DAC obstrutiva foi feito em 27,5% dos pacientes de cada grupo e 22,3% dos pacientes do grupo angioTC foram submetidos a coronariografia. O tempo de seguimento médio foi 3,5 anos.

Não houve diferença no desfecho primário entre os grupos, sendo que ocorreu em 2,1% no grupo angioTC e em 3% no grupo coronariografia, com taxa anual de eventos cardiovasculares maiores de 0,61% no grupo angioTC e 0,86% no grupo coronariografia. A análise de subgrupos manteve resultados consistentes.

Em relação aos desfechos secundários, houve 42 complicações, sendo 33 associadas a coronariografia e nove a angioTC. As complicações foram quatro vezes mais frequentes em quem foi submetido a revascularização do que quem não foi revascularizado.

Em relação a desfechos clínicos, durante as últimas quatro semanas de seguimento, angina foi relatada em menos de 10% dos pacientes, sem diferença entre os grupos. Também foram semelhantes qualidade de vida e tratamento medicamentoso.

Comentários e conclusão

Neste estudo, não houve diferença nos desfechos entre pacientes que realizaram angioTC ou coronariografia como avaliação inicial de dor torácica e o grupo angioTC teve menor ocorrência de complicações maiores e procedimentos de revascularização. Apenas 22% dos pacientes que realizaram angioTC necessitaram de coronariografia posterior, com consequente redução das complicações em decorrência deste exame.

Esses achados complementam estudos prévios, como o PROMISE e o SCOT-HEART, que compararam angioTC com exames funcionais não invasivos, e confirmam a segurança da realização da angioTC como exame inicial em pacientes com dor torácica estável.

Algumas limitações importantes foram que não houve avaliação de ocorrência de eventos assintomáticos (IAM e AVC periprocedimento), o que pode ter favorecido o grupo submetido a coronariografia, e não houve avaliação de custo-efetividade em relação a cada exame. Além disso, a taxa de eventos foi menor que a esperada nos dois grupos, provavelmente em decorrência de melhorias tanto nos exames complementares quanto no tratamento médico do paciente como um todo.

Mensagem prática

A angioTC de coronárias vem ganhando cada vez mais espaço, sendo amplamente utilizada na prática clínica. Este estudo reforça sua utilidade no diagnóstico de pacientes com dor torácica estável e probabilidade intermediaria de DAC. É importante enfatizar que este é o grupo de pacientes que tem maior benefício deste exame e os que tem probabilidade baixa ou alta da doença devem ser avaliados de acordo.






Autor: Isabela Abud Manta
Fonte: PEBMED
Sítio Online da Publicação: PEBMED
Data: 24/03/2022
Publicação Original: https://pebmed.com.br/investigacao-de-dor-toracica-estavel-angiotomografia-ou-cateterismo/

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