terça-feira, 7 de maio de 2019

Da pílula de insulina à tinta antimicrobiana: as inovações tecnológicas que prometem salvar vidas



O uso indiscriminado de antibióticos fez com que algumas bactérias se tornassem resistentes aos medicamentos — Foto: Shutterstock



As chamadas doenças tropicais negligenciadas (DTNs) afetam mais de 1 bilhão de pessoas e custam todos os anos bilhões de dólares às economias de países em desenvolvimento, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS).


As populações que vivem na pobreza, sem saneamento básico adequado e em contato direto com vetores de infecções são as mais afetadas por essas doenças, que predominam em condições tropicais.


Para complicar, infecções virais como o sarampo e a tuberculose, que foram praticamente erradicadas há um século, estão novamente em ascensão.


E doenças mais comuns passíveis de tratamento - como a gripe, por exemplo - são responsáveis por milhares de mortes que poderiam ser evitadas a cada ano.


Felizmente, as novas tecnologias médicas apresentam um grande potencial para controlar infecções, conter surtos e até mesmo fornecer suprimentos para salvar vidas em regiões remotas.


Da tinta antimicrobiana a vacinas sem agulha e drones que transportam órgãos para transplante, as inovações tecnológicas estão se tornando rapidamente uma realidade na medicina.


No curto prazo, essas novas ferramentas podem aumentar a taxa de sobrevivência de pacientes com uma série de doenças; no longo prazo, podem ajudar a entender a epidemiologia dos agentes patogênicos, essencial para o desenvolvimento de programas globais de controle de doenças.



Insulina sem dor



Certos medicamentos só podem ser administrados por meio de injeção. A aplicação é dolorosa para os pacientes e trabalhosa para os profissionais de saúde - além disso, a falta de agulhas hipodérmicas esterilizadas em algumas áreas pode levar a infecções.


Diante deste contexto, cientistas do Instituto Koch de Pesquisa Integrada sobre o Câncer, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT, na sigla em inglês), e do Brigham and Women's Hospital, afiliado à Universidade Harvard, nos EUA, desenvolveram uma espécie de pílula de insulina.


Trata-se de uma cápsula capaz de transportar o hormônio pelos obstáculos do sistema digestivo até chegar ao estômago, onde é absorvido pela corrente sanguínea.


Funciona da seguinte maneira: uma vez ingerida, a cápsula libera um dardo de insulina, ativado por meio de uma mola, que é aplicado diretamente na parede do estômago.


Os pesquisadores publicaram suas descobertas na revista científica Science, explicando que se "inspiraram na capacidade de auto-orientação da tartaruga-leopardo" - a cápsula foi criada nos moldes do casco do animal.



Será que pacientes com diabetes vão poder receber insulina sem precisar da picada de agulha? — Foto: Pixabay


O aplicador de insulina sabe, portanto, como se posicionar de forma que sua agulha microscópica atinja diretamente o tecido estomacal, sem perfurar nenhum órgão ao longo do caminho.


Pacientes com diabetes tipo 1 - doença autoimune na qual o pâncreas não produz insulina suficiente - recebem injeções diárias do hormônio, responsável por controlar a glicose no sangue.


Mas, em breve, talvez sejam capazes de controlar sua condição com a ajuda desta cápsula do tamanho de uma ervilha.



Tinta antimicrobiana contra 'superbactérias'



Cerca de 10% dos pacientes hospitalizados contraem uma nova doença durante o período de internação - muitas vezes depois de entrar em contato com equipamentos e superfícies infestados de germes.


Em todo o mundo, 700 mil pessoas morrem a cada ano em decorrência de infecções resistentes a medicamentos, incluindo tuberculose, HIV e malária.


A OMS classificou recentemente a resistência a antibióticos como uma "ameaça à saúde global".


Como resposta, a agência que controla os alimentos e medicamentos dos EUA (FDA, na sigla em inglês) e diversas empresas líderes no mercado de tinta se uniram para desenvolver uma variedade de revestimentos antimicrobianos que podem ser aplicados em equipamentos e materiais hospitalares.


Estes aditivos antibacterianos são adicionados à tinta ou ao verniz durante seu processo de fabricação; a tinta é então aplicada na superfície que, uma vez seca, se torna resistente a micróbios, mofo e fungos.


A BioCote produz tintas antimicrobianas que são vendidas comercialmente, oferecendo um mecanismo promissor para combater as chamadas "superbactérias": aquelas que são resistentes a antibióticos e podem infectar superfícies hospitalares, contaminando pacientes que já estão com a imunidade baixa.


Ironicamente, as mesmas substâncias químicas presentes em produtos antibacterianos - como desinfetantes e gel para higienizar as mãos - usados na limpeza de hospitais e equipamentos médicos são conhecidos por promover as cepas antibacterianas (resistentes a antibióticos), matando bactérias boas e más da mesma forma.


Desde a invenção no início do século 20, os antibióticos salvaram inúmeras vidas, erradicando doenças causadas por bactérias nocivas; mas, assim como o uso excessivo das drogas enfraqueceu sua eficácia, a tinta antimicrobiana não é uma medida infalível.


É seguro dizer que, desde que não confiem nela como único método, os hospitais podem adicionar a tinta antibacteriana à lista de procedimentos de combate a doenças.



Âncoras criptografadas contra remédios falsos



As fraudes custam à economia global mais de 3 trilhões de libras por ano (cerca de R$ 15,5 trilhões). Da corrupção corporativa à falsificação de eletrônicos, elas permeiam quase todos os setores, incluindo o sistema de saúde: em alguns países, quase 70% de certos medicamentos são falsos.


As falhas de conexão de internet podem ser um obstáculo à saúde pública em países em desenvolvimento — Foto: Pixabay/Divulgação


No início de fevereiro, a Organização Mundial da Saúde (OMS) alertou para uma leva de medicamentos falsificados para leucemia que estava circulando pelas Américas e pela Europa. Médicos encontraram ainda vestígios de ecstasy e de ingredientes do Viagra em comprimidos supostamente antimaláricos.


Acontece que garantir a autenticidade dos medicamentos é quase tão difícil quanto monitorar contas bancárias ou produtos eletrônicos. A cadeia de suprimentos complexa, composta por dezenas de fornecedores em vários países, dificulta evitar que pessoas mal-intencionadas adulterem os remédios.


O mercado de medicamentos legalizados superou o de narcóticos ilegais, um fato que não passou despercebido pelos traficantes de drogas; e quando um paciente não se recupera após tomar um remédio (falsificado), os médicos geralmente culpam a doença, e não o medicamento.


Mas tudo isso pode mudar em breve, graças a uma equipe de pesquisadores da IBM que estão desenvolvendo âncoras criptografadas - impressões digitais à prova de fraudes que podem ser incorporadas aos produtos e conectadas a um blockchain para assegurar sua autenticidade (o blockchain é uma espécie de banco de dados descentralizado que usa criptografia para registrar as transações).


A âncora criptografada é menor do que um grão de areia e pode assumir várias formas - pode ser, por exemplo, um código óptico colocado em um comprimido, capaz de distingui-lo de remédios falsos, praticamente da mesma forma que os diamantes verdadeiros são marcados para serem diferenciados de imitações.


Os pesquisadores também estudam incorporar a âncora criptografada a uma tinta magnética comestível, que poderia então ser usada para revestir um comprimido antimalárico. Uma gota de água ativaria visivelmente o código, garantindo aos consumidores que a pílula é autêntica e segura.


Como seus códigos de identificação não podem ser duplicados ou copiados, as âncoras criptografadas são altamente seguras, oferecendo aos pacientes, médicos e demais profissionais de saúde segurança adicional em um cenário farmacêutico cada vez mais fraudulento.



Conexão gratuita



Não damos muito valor à conexão com a internet, mas muitos lugares não têm acesso a uma rede confiável. Falhas na comunicação digital durante uma crise de saúde pública podem ter consequências devastadoras - como doses de medicamentos perdidas, fichas de pacientes incorretas, tomadas de decisão infelizes, erros médicos e informações incompletas sobre surtos de doenças.


Na África, continente em que 1,1 bilhão de habitantes dependem principalmente da internet móvel, a conectividade é notoriamente ruim; o problema é agravado pelo fato de que os usuários geralmente tentam acessar conteúdos que estão em um servidor remoto em algum lugar dos Estados Unidos ou da Europa.


A solução é se conectar à Moja, uma rede pública de Wi-Fi gratuita criada pela empresa BRCK, desenvolvida para áreas com acesso limitado à internet.


Mais do que apenas um roteador, essa Rede de Distribuição de Conteúdo substitui de forma eficaz os dados móveis - e caros - permitindo que os usuários naveguem na internet e nas redes sociais sem custo adicional, já que qualquer um que esteja dentro do alcance do sinal da Moja pode se conectar à internet de graça.


A rede de servidores do Moja hospeda conteúdo do Facebook, Netflix e Youtube, mas também tem um grande impacto no gerenciamento de doenças: usuários em áreas remotas podem trocar mensagens e compartilhar informações em tempo real, simplificando a comunicação entre médicos, pacientes, hospitais e voluntários da área de saúde.


Além disso, o hardware da BRCK foi projetado levando em conta os desafios climáticos e ambientais: o Moja usa roteadores de alumínio resistentes e à prova d'água, com várias portas de energia, garantindo que os aplicativos funcionem sem problema mesmo em condições hostis.




Autor: BBC
Fonte: G1 Saúde
Sítio Online da Publicação: G1 Saúde
Data: 07/05/2019
Publicação Original: https://g1.globo.com/ciencia-e-saude/noticia/2019/05/05/da-pilula-de-insulina-a-tinta-antimicrobiana-as-inovacoes-tecnologicas-que-prometem-salvar-vidas.ghtml

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