sábado, 13 de março de 2021

Livro apresenta o olhar da juventude brasileira sobre a Ciência

A nova geração, que cresceu conectada à Internet, tem uma forte relação com as novas tecnologias e é bombardeada com um universo de informações rápidas e, muitas vezes, superficiais e pouco confiáveis. Para entender qual a percepção da juventude no Brasil sobre temas relacionados à Ciência e Tecnologia (C&T) e às carreiras científicas, uma pesquisa realizada pelo Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Comunicação Pública da Ciência e Tecnologia (INCT-CPCT) ouviu, por meio de questionários estruturados, 2.206 brasileiros e brasileiras entre 15 e 24 anos, em situação urbana, residentes em 79 cidades de todas as regiões do País. Os resultados do estudo, inédito pela temática e abrangência nacional, estão reunidos no livro O que os jovens brasileiros pensam da ciência e da tecnologia, que pode ser acessado aqui (https://www.inct-cpct.ufpa.br/index/2021/02/19/livro-jovens-brasileiros-ciencia/).

Escrito sob a coordenação da pesquisadora Luisa Massarani, líder do INCT-CPCT – rede de grupos de pesquisa nacionais e internacionais sediada na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) –, o livro aborda questões como o interesse da juventude pela Ciência, a valorização da carreira de cientista, as controvérsias nos debates em voga sobre aceitar ou não evidências científicas, a influência das trajetórias de vida e do posicionamento moral e político sobre as atitudes relacionadas à C&T e as reações a um ambiente informacional marcado pela circulação de conteúdos falsos (fake news). “Nossos dados sugerem que os jovens possuem interesse e respeito pelos cientistas, que são considerados muito confiáveis. Mas também sugerem que muitos jovens pensam que fazer Ciência não é para eles, seja por ser muito difícil ou porque cientistas são pessoas diferentes de uma pessoa normal”, disse Luisa. Também coordenam a pesquisa Yurij Castelfranchi, Vanessa Fagundes e Ildeu Moreira, vice-coordenador do INCT-CPCT.

Luisa conta que, mesmo antes da existência do INCT, o grupo já vinha realizando estudos sobre o que os brasileiros e as brasileiras pensam da C&T, sendo que o primeiro estudo foi realizado em 2005, analisando a população brasileira a partir dos 16 anos. “Mas tínhamos o sonho de fazer um estudo específico com jovens. Tal estudo foi possível com a criação do INCT-CPCT, que reuniu a expertise acumulada de estudos anteriores e os recursos financeiros”, contextualizou. O projeto foi contemplado na chamada de apoio aos Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCT), que envolveu o repasse de recursos pela FAPERJ, pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).

Além da aplicação dos questionários, realizada em 2019, com a metodologia quantitativa conhecida tecnicamente como survey, a pesquisa também contou com etapas cognitiva e qualitativa, esta última formada por grupos de discussão com jovens entre 18 e 24 anos, residentes nas cidades do Rio de Janeiro e Belém. “Uma dessas etapas foi para testar as perguntas que fizemos, ou seja, conversamos com 70 jovens para ver se nossas perguntas faziam sentido, se eram entendidas da mesma forma como pretendíamos. Além disso, fizemos grupos focais com cerca de 40 jovens, para aprofundar alguns temas, como as fake news”, explicou a comunicadora, que é referência na área de Divulgação Científica.

Um dos aspectos destacados na obra é a redução, em diversos países do mundo, do interesse dos jovens pelas carreiras científicas. Esse dado expõe a necessidade de políticas públicas mais assertivas com o objetivo de atrair e reter a juventude nas áreas de C&T. “No Brasil, um aspecto importante é aumentar as oportunidades de inserção profissional para os jovens cientistas. Até poucos anos era diferente, mas no presente momento há poucas oportunidades de trabalho para os diversos jovens que passam anos se capacitando. Temos excelentes jovens cientistas. Mas muitos deles estão desistindo e buscando alternativas em outros países”, ponderou.


Luisa Massarani destaca a importância da Divulgação Científica e de políticas públicas voltadas para a
inserção dos jovens cientistas no mercado de trabalho


De acordo com o levantamento, apesar de majoritariamente demonstrarem confiança nos cientistas e interesse por temas científicos, a maioria dos jovens que participaram do estudo, incluindo os de curso superior, não consegue citar o nome de uma instituição nacional de pesquisa nem de algum cientista brasileiro. “Ambos os dados (alto interesse declarado pela ciência e não saber mencionar o nome de uma instituição científica ou pesquisador brasileiros) estão em consonância com os dados nacionais com a população adulta também, ou seja, não é um problema apenas entre jovens”, ressaltou Luisa. Uma questão que chama a atenção é que muitos jovens estão na universidade ou poderiam estar. Ainda assim, não identificam as universidades brasileiras como local em que se faz pesquisa – embora 95% da produção científica brasileira sejam feitas em universidades. “Isto sinaliza que é fundamental que as universidades sejam mais ativas em divulgar a Ciência que fazem. Em outras palavras, o ‘problema’ não necessariamente se localiza apenas nos brasileiros e brasileiras, mas também no fato de que é necessária uma Divulgação Científica mais ativa”, acrescentou.

No estudo, os jovens declararam ter dificuldade em verificar se uma notícia de C&T é falsa ou não. Segundo eles, Whatsapp e Facebook estão entre os principais difusores de notícias falsas. “Os jovens estão muito conscientes da existência e da periculosidade das fake news. Sabem que estão expostos às fake news: por exemplo, o Whatsapp é uma das fontes mais importantes para eles de temas de ciência, mas também é considerado por eles como uma das principais fontes de fake news. No entanto, eles sentem que não conseguem identificar quando uma notícia é falsa e se sentem muito vulneráveis”, detalhou. Os entrevistados confirmaram a importância das redes sociais como fontes de informação. Segundo a pesquisa, os principais meios pelos quais os jovens acessam informações sobre C&T são o Google, o YouTube, o Whatsapp e o Facebook.

Diversos pontos interessantes citados na publicação elucidam o que a juventude brasileira pensa sobre a C&T. Curiosamente, no país do futebol, o interesse declarado pelos jovens por temas de Meio Ambiente e Medicina (80% e 74%, respectivamente) é maior do que o interesse nos Esportes (62%) por religião (67%). Eles, em sua maioria, percebem a importância social da C&T. Acreditam que a Ciência e a Tecnologia são importantes para o País e que os benefícios do desenvolvimento técnico-científico são elevados – e, em geral, maiores que os riscos. Para os jovens, os cientistas estão entre as fontes mais confiáveis de informação. Eles têm uma imagem majoritariamente positiva da figura do (a) cientista. Grande parte dos jovens acredita que a profissão de cientista é atraente, mas difícil de se alcançar, e que homens e mulheres têm a mesma capacidade para ser cientistas e que devem ter as mesmas oportunidades. Mesmo neste momento de crise econômica, política e de confiança nas instituições, a esmagadora maioria dos jovens afirma que o investimento brasileiro em C&T deveria ser aumentado ou mantido, não diminuído. Poucos jovens visitam museus de ciência e outros espaços de difusão do conhecimento ou culturais, como parques ambientais, jardins botânicos, museus de arte etc. E, ainda, 60% dos jovens brasileiros não sabem que antibióticos não combatem vírus e 75% discordam, inteiramente ou em parte, da afirmação de que vacinar as crianças pode ser perigoso.

A pesquisa aponta questões importantes para o desenho de políticas públicas e iniciativas de Divulgação Científica destinadas aos jovens. Luisa destaca que saber divulgar a Ciência é importante para mostrar como ela pode ter um papel fundamental no desenvolvimento social e econômico de um país. “Durante a pandemia, a Divulgação Científica ganhou muita evidência mostrando que a Ciência é uma das principais estratégias para o enfrentamento do vírus. Permite desenvolver vacinas, medicamentos e tratamentos – e isto tem sido feito em uma velocidade extremamente rápida. Permite entender questões básicas como o funcionamento do vírus, como ele se propaga, em que condições infecta. Permite entender, com evidências científicas, porque o uso de máscaras e o isolamento social são importantes para o controle da doença”, ponderou. Nesse sentido, a obra preenche uma lacuna, tornando-se um acréscimo importante à bibliografia disponível sobre o tema. “Até onde sabemos, é o primeiro estudo de caráter nacional com este objetivo realizado com jovens”, concluiu.

Constituído em 2016, o INCT-CPCT reúne grupos de pesquisa com o objetivo de realizar estudos de alto impacto e gerar novos conhecimentos na área de Comunicação Pública da Ciência e Tecnologia. Contando com a atuação de mais de 100 pesquisadores, oriundos de 25 universidades e instituições científicas brasileiras e internacionais, o Instituto investiga, desenvolve, aplica e testa um conjunto de metodologias, instrumentos e ações, relacionadas com a divulgação científica, que contribuam para a melhoria das atividades de popularização de C&T e de educação científica, fornecendo subsídios para o aprimoramento de políticas públicas no setor e promovendo a formação e qualificação de pessoas capacitadas para atuar em pesquisa e atividades da área. Mais informações: www.inct-cpct.ufpa.br




Autor: Débora Motta
Fonte: FAPERJ
Sítio Online da Publicação: FAPERJ
Data: 04/03/2021
Publicação Original: http://www.faperj.br/?id=4171.2.0

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