“Estamos em um carro gigante, acelerando na direção de uma parede de tijolos
e todo mundo fica discutindo sobre onde cada um vai sentar”
(David Suzuki)
O mundo vive uma emergência climática e ecológica. Nunca, no Holoceno (últimos 12 mil anos), a humanidade enfrentou uma ameaça global tão significativa. E o pior é que a ameaça existencial atual é provoca pelo estilo de vida e as formas de produção e consumo predominantes na sociedade. A humanidade está na iminência de se tornar o agente de um novo evento ambiental cataclísmico, sendo desta vez, simultaneamente, o asteroide e os dinossauros.
A vida selvagem (não humana) está em perigo diante do crescimento das atividades antrópicas e o aquecimento global e a 6ª extinção em massa das espécies coloca em perigo a civilização e suas conquistas. Existe uma urgência para se adotar ações imediatas para evitar o colapso ecológico e civilizacional.
Diante da dimensão das duas grandes ameaças vitais (Alves, 2019), todos os problemas particulares e específicos serão subsumidos pela emergência climática e ambiental. Desta forma, a contradição central do século XXI será, cada vez mais, a oposição entre “capital antrópico” e o “capital natural” (Alves, 2015).
O marxismo foi construído sobre o pilar da contradição “capital versus trabalho”. Por conta disto, Rosa Luxemburgo lançou a palavra de ordem “Socialismo ou Barbárie”. Acontece que o capitalismo e as forças do progresso civilizacional foram capazes de ampliar o bem-estar da população mundial (aumento e diversificação da cesta de consumo, avanço da educação, redução da mortalidade infantil, aumento da esperança de vida, etc.), evitando a barbárie, enquanto “selvageria social”. O próprio “socialismo de mercado” da China e do Vietnã segue a mesma linha de aumento das forças produtivas às custas do empobrecimento do meio ambiente.
Assim, existe um paralelo entre os lemas: “Socialismo ou Barbárie” e “Rebelião ou Extinção”. A diferença é que o contraponto antropológico e social entre barbárie e civilização – inspirada na obra de Lewis Morgan e propagada por Friedrich Engels – ficou superada pela contradição entre civilização (capitalismo ou socialismo real) e extinção da vida na Terra. Portanto, o movimento “Rebelião ou Extinção” foca na emergência climática e ambiental e mostra que precisamos adotar novos estilos de vida que sejam compatíveis com o equilíbrio homeostático do Planeta.
A primeira tarefa é a rebelião contra o imperativo do crescimento econômico sustentado e infinito em um Planeta finito e contra o estilo de vida que degrada a saúde dos ecossistemas e provoca a 6ª extinção em massa das espécies. A rebelião vai além e engloba as questões das lutas de classes, das lutas identitárias e da oposição entre mercado e Estado. Trata-se de um movimento global para resistir contra uma ameaça existencial que é cada vez mais iminente. Rebelar a favor da vida (humana e não humana) e contra a extinção, conjugando direitos humanos, direitos dos animais e direitos da natureza.
O movimento “Rebelião ou Extinção”, inspirado nas ideias de Henry Thoreau (1817-1862), utiliza a resistência pacífica (não-violenta) e a desobediência civil para engajar as pessoas na luta contra o colapso climático e ambiental, evitando o holocausto ecológico e o risco de extinção da raça humana e demais espécies. O objetivo do movimento “Rebelião ou Extinção” é exercer pressão sobre os governantes e fortalecer a sociedade civil no sentido de enfrentar a maior crise ambiental do Holoceno. A “Rebelião ou Extinção” se baseia no fato, cientificamente estabelecido, de que a humanidade não está apenas destruindo o ambiente natural, mas também, na trajetória atual, caminhando para a extinção em um futuro não muito distante. Assim, urge conscientizar as autoridades a tomar ações drásticas e mudar de rumo do desenvolvimento enquanto ainda seja possível.
O grupo Rebelião ou Extinção tem três demandas centrais: 1) que o governo “conte a verdade à população declarando uma emergência climática e ecológica”; 2) que o governo “zere as emissões líquidas de gases de efeito estufa até 2025”; 3) que o governo “crie uma assembleia popular, formada por cidadãos comuns e escolhidos aleatoriamente, e siga suas decisões sobre o meio ambiente”.
Abaixo segue a “Declaração de apoio dos cientistas à ação direta não violenta contra a inação dos governos diante das mudanças climáticas e da emergência ecológica”:
“ESTA DECLARAÇÃO EXPÕE O CONSENSO CIENTÍFICO ATUAL RELATIVO À EMERGÊNCIA CLIMÁTICA E ECOLÓGICA E DESTACA A NECESSIDADE DE AÇÃO URGENTE PARA EVITAR DANOS ADICIONAIS E IRREVERSÍVEIS À HABITABILIDADE DO NOSSO PLANETA.
Como cientistas, dedicamos nossas vidas ao estudo e compreensão do mundo e nosso lugar nele. Declaramos que as evidências científicas mostram, além de qualquer dúvida razoável, que as mudanças causadas por humanos nos solos, no mar e no ar da Terra estão ameaçando severamente a habitabilidade do nosso planeta. Declaramos ainda que evidências esmagadoras mostram que, se as emissões globais de gases de efeito estufa não forem reduzidas rapidamente para zero líquido e a perda de biodiversidade não for interrompida, corremos o risco de danos catastróficos e irreversíveis aos nossos sistemas planetários de suporte à vida, causando sofrimento humano incalculável e muitas mortes.
Observamos que, apesar de a comunidade científica ter soado o alarme do aquecimento global causado pelo ser humano há mais de quatro décadas, nenhuma ação dos governos até o momento foi suficiente para deter o aumento acentuado das emissões de gases de efeito estufa, nem abordar a perda cada vez maior da biodiversidade. Portanto, pedimos uma ação imediata e decisiva dos governos em todo o mundo para reduzir rapidamente as emissões globais de gases de efeito estufa para zero líquido, evitar mais perdas de biodiversidade e reparar, na máxima extensão possível, os danos que já foram causados. Apelamos ainda aos governos para que prestem apoio particular àqueles que serão mais afetados pelas mudanças climáticas e pela transição necessária para uma economia sustentável.
Como cientistas, temos uma obrigação que se estende além da simples descrição e compreensão do mundo natural, para participar ativamente da proteção. Observamos que a comunidade científica já tentou todos os métodos convencionais para chamar a atenção para a crise. Acreditamos que a contínua inação governamental sobre a crise climática e ecológica justifica agora protestos pacíficos e não-violentos e ação direta, mesmo que isso vá além dos limites da lei atual.
Portanto, apoiamos aqueles que se levantam pacificamente contra governos de todo o mundo que não conseguem agir, proporcionalmente, à escala da crise.
Acreditamos que é nosso dever moral agir agora e instamos outros cientistas a se juntarem a nós para ajudar a proteger o único lar da humanidade”.
Nota sobre o símbolo da “Extinction Rebellion”: O círculo significa o planeta, enquanto a ampulheta dentro serve como um aviso de que o tempo está se esgotando rapidamente para muitas espécies. Atualmente, o mundo está passando por um evento de extinção em massa e esse símbolo visa ajudar a aumentar a conscientização sobre a necessidade urgente de mudança, a fim de enfrentar esta crise. Estima-se que entre 30.000 e 140.000 espécies sejam extintas a cada ano no que os cientistas denominaram Holoceno, ou Sexta Extinção em Massa. Esse processo contínuo de destruição está sendo causado pelo impacto da atividade humana. É provável que uma perda catastrófica de biodiversidade cause um colapso generalizado do ecossistema e, consequentemente, torne o planeta inabitável para os seres humanos.
José Eustáquio Diniz Alves
Colunista do EcoDebate.
Doutor em demografia, link do CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/2003298427606382
Referências:
ALVES, JED. A crise do capital no século XXI: choque ambiental e choque marxista. Salvador, Revista Dialética Edição 7, vol 6, ano 5, junho de 2015 http://revistadialetica.com.br/wp-content/uploads/2016/04/005-a-crise-do-capital-no-seculo-xxi.pdf
ALVES, JED. A vida na Terra tem duas ameaças vitais: mudanças climáticas e ecocídio, Ecodebate, 19/06/2019
https://www.ecodebate.com.br/2019/06/19/a-vida-na-terra-tem-duas-ameacas-vitais-mudancas-climaticas-e-ecocidio-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/
Alice O’Keeffe. This Is Not a Drill review – an Extinction Rebellion handbook, The Guardian, 07/08/2019 https://www.theguardian.com/books/2019/aug/07/this-is-not-a-drill-extinction-rebellion-review
Declaração de apoio dos cientistas à ação direta não violenta contra a inação do governo diante das mudanças climáticas e a emergência ecológica, 2019
https://docs.google.com/document/d/1FuZYG-gT5EPTLDyvgNnlYIS5dAy43TM1MnvOls48qIc/edit
Extinction Rebellion (XR): https://rebellion.earth/
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 01/11/2019
Autor: EcoDebate
Fonte: EcoDebate
Sítio Online da Publicação: EcoDebate
Data: 01/11/2019
Publicação Original: https://www.ecodebate.com.br/2019/11/01/declaracao-de-apoio-dos-cientistas-ao-movimento-rebeliao-ou-extincao-por-jose-eustaquio-diniz-alves/
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